sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Triste realidade

As constantes informações, principalmente aquelas obtidas através da imprensa, além dos episódios testemunhados por todos, mostra-nos um quadro crescente da violência em todo o mundo, cujos reflexos, senão indícios primários, já se verificam em nossa cidade. A partir daí, conseqüentemente, somos levados à meditação sobre a realidade das cadeias públicas e penitenciárias do país. Infelizmente, essas instituições não passam, como sempre o foram, de despejos de homens facínoras, delinqüentes, celerados, corruptos, pusilânimes etc, mas são homens. Ainda que autores das mais terríveis atrocidades, são seres humanos. Às vezes, o trabalho de agentes da Pastoral Carcerária e de órgãos de defesa da dignidade humana são mal compreendidos, só que eles procuram exercer uma função que caberia a toda a sociedade; no entanto, a situação moralmente caótica, só tentam remediá-la quando já avança em estágios finais.
A realidade cá fora, no Brasil, já é de um verdadeiro clima de guerra civil. O povo só não deu conta disso, ou não quis admiti-lo, porque ainda há o futebol, samba, cerveja gelada e novela das oito (que hoje é das nove). Mas um Estado onde não se respeita a autoridade policial, muitas vezes porque ela também não zelou pelo seu caráter de proporcionar a segurança pública, isso, por sua vez, em decorrência da falta de sua própria segurança e de salários dignos, vendo-se, portanto, por aí, que a máquina social está se desgastando cada vez mais, causando toda essa desordem no país, está prestes a uma autodestruição. Ainda assim, nenhuma providência enérgica contra os infratores da ordem é tomada.
Quando esses infelizes são detidos e jogados no submundo dos ergástulos, eles se vêem e sentem as conseqüências desses infernos da sociedade. Nas prisões se misturam as classes (exceto os que têm curso superior), passam dias e anos entre quadro paredes criminosos de todos os tipos, podendo estar lado-a-lado o ladrão de galinha e o estuprador; o assassino e o estelionatário; a prostituta e o maníaco. Como se espera a recuperação dessas pessoas, para que possam vir a se reintegrar na sociedade após “pagarem” sua pena? Na maioria dos casos, o sentimento que nutrem 24 horas por dia é o de vingança e o de como fazer para sair dali. Entre eles não há nenhum respeito. A tensão de seus ânimos se inflama ainda mais com as condições em que vivem. Não há perspectiva de recuperação na maioria das cadeias públicas e penitenciárias do Brasil, se mantiverem o sistema obsoleto e desumano que ainda vigora.
Em meio a esse quadro sombrio e, de certa forma, desolador, por vezes, alguma voz se alça pedindo mais justiça, propondo a pena de morte. Vale lembrar, por isso, um episódio que se passou no interior de Minas, numa das últimas execuções de pena de morte, ainda nos tempos do Império do Brasil. Um detento de uma cadeia pública havia matado um companheiro de cela por causa da comida, que estava racionada. O assassino foi levado a julgamento e condenado à morte. No dia da execução, um sacerdote, ao proferir o sermão antes do enforcamento, lembrou que aquele homem seria enforcado vítima de seus desvarios, e estes em conseqüência da falta do respeito que o Estado deveria devotar àquela criatura. Ele matou porque tinha fome, na luta pela sobrevivência, e ele tinha fome porque não lhe davam de comer. A pena de morte só poderia ser aplicada num estado que estivesse imune de qualquer erro em sua organização, imune de qualquer falha em sua integração. Ora, um estado imune de qualquer erro ou falha é um estado perfeito. Logo, a um estado perfeito não há o que corrigir, portanto não se aplicaria a pena de morte. Subentende-se, então, que a pena de morte é inconcebível, principalmente na presente situação.O homem, carente de afetividade, por pior que seja, sem respeito e sem caridade jamais se recuperará. E é a isso que os agentes da Pastoral Carcerária se propõem, levar conforto espiritual e uma palavra de incentivo, para que consigam suportar o sofrimento que lhes visita nas prisões, preparando-se para se reintegrarem à sociedade. Ao Estado, caberia uma reformulação do sistema penitenciário. Há diversos graus de delinqüência e isso deveria ser meticulosamente observado para que se alcançasse um índice maior de recuperação desses seres humanos.
26/11/2004