sexta-feira, agosto 29, 2008

Em prol da vida

Busca-se no Brasil, de todas as formas, legalizar o aborto; ao menos, vão-se dando margens para que ele seja implantado definitivamente, ao livre arbítrio de quem queira se submeter a ele. É a legalização da cultura da morte, ou civilização da morte, como a definiu o Papa João Paulo II, “opondo-se frontalmente aos valores da doutrina cristã, que defende a vida acima de tudo (...) esta cultura destruidora propõe a morte como solução de uma série de problemas”.
Admitiram, primeiramente, o aborto em determinados casos; aliás, sempre fizeram “vistas grossas” – como se costuma dizer – sobre uma questão que, na iminência de causar qualquer transtorno pessoal, familiar ou social, é mais fácil admiti-la adotando o recurso que a barbárie e a impiedade sempre souberam utilizar: a morte. Depois, as autoridades responsáveis por assegurar o direito de todos, inclusive de zelar pelos princípios da conduta humana e social, não conseguiram assimilar os danos éticos que a permissão às pesquisas de células embrionárias pode causar. Agora, enquanto escrevo estas linhas, o Superior Tribunal Federal em Brasília discute a tese que permite a interrupção da gravidez em casos de fetos anencéfalos.
De acordo com o procurador Paulo Silveira Leão Júnior e com o médico Rodolfo Acatauassú Nunes, “um ser vivo com grave deficiência cerebral, mas com pequena capacidade de sobrevida e possivelmente um nível primitivo de consciência”, tanto que, há pouco tempo, assistimos a um caso de uma criança anencéfala que morreu com mais de um ano de idade. Leão Júnior atenta para “os direitos constitucionais da inviolabilidade da vida, da dignidade e do bem-estar”.
A partir do momento em que não se respeita mais a vida, principalmente de seres indefesos, libera-se o homem para submeter-se a todo e qualquer tipo de atrocidade, sem nenhum limite moral ou ético. Abrir-se-ão as portas para que se liberem também a contracepção, a esterilização, eutanásia, a pena de morte, o uso de drogas, enfim, para que o homem não se sujeite à ordem, ao respeito, a Deus. Lembrando ainda João Paulo II: “...uma grave derrocada moral da sociedade: opções, outrora consideradas criminosas e rejeitadas pelo senso moral comum, tornam-se socialmente respeitáveis” (Evangelium Vitæ, nº 5); e, mais além: “tratam-se de ameaças programadas de maneira científica e sistemática” (nº 17).
Oxalá as pessoas atentem para a importância desse tema que tem sido discutido de forma tão restrita à comunidade científica e aos poderes da República, enquanto a população, em grande parte, fica cá embaixo sem entender direito a sua gravidade, distraída com as leviandades do mundo, a violência crescente, escândalos e disputas políticas. No estado democrático, todos devem ter amplo conhecimento de tudo o que seja de interesse comum, antes de se tomar qualquer decisão. Ainda lembrando o saudoso Pontífice, “a vida está jurada de morte”. Por isso, todos os cristãos são chamados a alistar-se nesta cruzada em prol da vida.

quinta-feira, agosto 28, 2008

O dom da vida

Celebrar a vida é celebrar a graça de Deus. Isso porque é Ele quem no-la concede. A nossa vida brota da fonte eterna e inesgotável de vida – Deus – à “cuja imagem e semelhança fomos criados” (Gn 1,26-27).

Se fomos criados à sua imagem e semelhança, devemos, portanto, ser espelhos onde se refletem a Sua glória e beleza; daí a tendência natural de sempre buscar o que há de bom, de belo e verdadeiro, por inspiração divina.

A presença neste mundo nos compromete com o projeto de salvação. Somos responsáveis por nós e por aqueles que conosco convivem. Somos cooperadores no plano de construção de um mundo mais fraterno, vislumbrando a plenitude da vida, a partir do momento em que desejamos ardentemente nada mais, senão buscar fazer a vontade do Pai. Desta forma, experimentamos o anelo que Santo Agostinho expressou nesta oração: “Fizestes-nos para Vós, Senhor, e o nosso coração está inquieto até que não descanse em Vós”.

E quando nos reunimos com pessoas queridas para celebrarmos a vida, outro cântico não nos inspira, somente o de louvor a Deus pela graça da existência.

Mais inspiração temos, ainda, ao contemplarmos o Mistério de Amor, em que um Deus se fez homem, morreu por nós e permanece conosco até o fim dos tempos, na Sagrada Eucaristia.

É o amor... É a entrega... É a partilha...

Celebrar a vida, portanto, é celebrar a graça de também podermos amar a Deus e ao próximo, à semelhança daquEle que nos criou. É nos entregarmos à missão de evangelizadores, anunciando a misericórdia de Deus. É partilharmos nossa vivência de fé e de amor, na família e na comunidade, sendo “sal da terra e luz do mundo” (Mt 5,13).

“Eu sou a vida” (Jo 14,6), disse Jesus a São Tomé. Esta afirmação ecoa até nossos dias, para não titubearmos ao querer buscá-lo sempre. “Eu vim para que todos tenham vida, e vida em plenitude” (Jo 10,10), também nos diz o Divino Amigo, assegurando-nos de que nenhum amor procede dEle, daí desejarmos amar nEle e por Ele. “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11,25), ainda é o Cristo amado entregando-se como remédio e salvação; em Sua graça renascemos, somos revestidos pelo homem novo “criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade” (Ef 4,24).

No Santo Tabernáculo está Jesus, nosso Mestre, a fonte onde devemos haurir a confiança, a determinação e a disposição para continuar a caminhada. Que nossa existência seja um constante hino de ação de graças ao Criador pelo dom da vida.

segunda-feira, agosto 25, 2008

À memória do Doutor Mário Pereira


Costuma-se dizer que o Brasil tem uma forte tendência em se desfazer de sua história. Realmente, diversos episódios contribuem para confirmar essa crença, principalmente quando vemos o descaso, chegando às raias do desrespeito, com a história e seus personagens. Recentemente, foi demolida a casa onde residiu o médico Mário Rodrigues Pereira, na avenida que leva o seu nome, no centro de Conselheiro Lafaiete. É mais uma referência histórica que se perde. A edificação, pelo seu peculiar estilo arquitetônico, era u’a marca, o registro de uma época em que a cidade se desenvolvia. Aliás, uma particularidade da antiga rua do Carmo, que depois recebeu o nome de avenida Benedito Valadares e, hoje, avenida Prefeito Mário Pereira, era ter em todo o seu percurso, edificações de estilos diversos, desde a Matriz da Conceição até a Igreja do Carmo, como o sobrado onde funcionou a antiga Câmara e que se incendiou, a Cadeia, o Clube Carijós (o segundo prédio), entre muitas casas residenciais. E a casa do Doutor Mário era mais um exemplar naquela vitrina de estilos arquitetônicos vários. Enfim...
Ao referir-se à casa demolida, faz-se necessário reconhecer o mérito de seu antigo proprietário que, muito mais que um político, foi um benfeitor para a cidade. De temperamento reservado, de franqueza, às vezes, mal compreendida, como afirmam alguns contemporâneos seu, contudo, um homem capaz de se dispor a tudo, fosse no exercício da medicina, fosse em prol do bem-estar da população. De família tradicionalmente política na região, honrou os cargos que exerceu, sempre com probidade e atento ao desenvolvimento do município.
Mário Rodrigues Pereira nasceu na Fazenda da Cachoeira, então localidade de Carandaí, a 19 de junho de 1898, filho do major Francisco Rodrigues Pereira e de Maria Alves Pereira. Seu pai, conhecido pela alcunha de Chico Barão, era filho do legendário Barão de Santa Cecília (coronel Francisco Rodrigues Pereira de Queiroz) e de sua prima Luciana Pereira de Queiroz. Apesar da semelhança do sobrenome Rodrigues Pereira, com o do patrono do município, o Barão e o Conselheiro Lafayette não tinham nenhum parentesco, como comprovam pesquisas genealógicas de ambos.
Chico Barão, nascido em 26 de março de 1870, formou-se em Farmácia na tradicional Escola de Ouro Preto, estabelecendo-se seguida em Queluz com a Pharmácia Pereira, tornando-se conhecido como o “médico da pobreza”, tal a atenção com que cuidava da população carente. Exerceu, ainda, o cargo de Juiz de Paz na comarca. Embora não tenha participado ativamente da política local, contam que, por ocasião da deposição de Washington Luiz, em 1930, Chico Barão foi levado preso pelo governo revolucionário que se impôs, como represália a seu filho, o advogado Francisco Rodrigues Pereira Júnior que se elegera deputado federal nas eleições daquele ano. Quando a notícia da prisão do farmacêutico espalhou-se pela cidade, um grupo de senhoras teria se colocado à frente da Cadeia Pública “exigindo” sua soltura. Ao pequeno grupo, outras pessoas foram se juntando e à pressão da massa não restou outra alternativa senão soltá-lo. Na ocasião, outros políticos locais também foram presos. Sua esposa, Maria Alves Pereira, conhecida como Dona Marucas, dizem ter sido uma senhora de lhano trato, muito caridosa, que zelou pela Igreja do Carmo por muitos anos.
Os primeiros estudos, Mário Pereira os fez em Queluz, com o professor Severino Ferreira da Silva, conhecido por Seu Virico, ao lado da Igreja do Carmo, e com a professora Honorina Baêta. Na capital mineira, cursou Humanidades e Medicina, doutorando-se na turma de 1922, na mesma turma do Dr. Juscelino Kubitscheck de Oliveira. Retornando a Queluz, passou a clinicar na antiga Santa Casa (atual Hospital Queluz), como assistente do Dr. Narciso de Queiroz, que veio a ser seu sogro, por haver contraído núpcias com dona Amélia Nogueira Queiroz. Trabalhou durante toda a sua vida naquele nosocômio, destacando-se na área de ginecologia. À frente da tradicional casa de saúde, empreendeu significativas melhorias naquele estabelecimento, atendendo a pacientes de toda a região.
Após os primeiros anos do governo provisório de Getúlio Vargas, retomada a estabilidade administrativa no país, Mário Pereira foi nomeado prefeito de Conselheiro Lafaiete, em setembro de 1934, empossado no dia 1º de outubro. Um acordo entre as lideranças políticas locais e o governador Benedicto Valladares possibilitou esse engajamento do jovem médico na lida administrativa.
De acordo com o historiador Jair Noronha, Doutor Mário Pereira, “modesto, despretensioso, tudo executou visando única e exclusivamente o bem estar coletivo”. Entre suas obras, destacam-se as construções dos prédios da Prefeitura, do Asilo Agrícola (onde funciona o Larmena), do Colégio Monsenhor Horta (edifício da escola estadual Narciso de Queirós) e a sede do Tiro de Guerra na rua Horácio de Queiroz, doando, ainda, terreno necessário à construção do estande para essa escola de instrução militar. Atento à formação da juventude, colaborou com a implantação do Colégio Monsenhor Horta, da Faculdade de Comércio e, antes, do Ginásio Queluziano, fundado pelo doutor Domingos de Souza Novais, ainda na década de 20.
Naqueles distantes anos 30, de estradas de rodagem muito precárias, sendo intensas as atividades da ferrovia, vislumbrou o progresso, adquiriu um terreno próximo ao distrito de Buarque de Macedo e doou-o ao governo federal, onde foi construído o Campo de Aviação de Lafaiete, para os aviões da rota Rio-Belo Horizonte, o atual Campo das Bandeirinhas. O desporto teve especial atenção do dinâmico prefeito, que estimulou os iniciantes clubes de vôlei e de basquete, além dos clubes de futebol, tendo idealizado e construído o estádio do Meridional Esporte Clube, que, aliás, recebeu o seu nome, e doado o terreno para o Guarany Esporte Clube construir o seu campo, no Alto da Vista Alegre.
Um moderno projeto de urbanização Doutor Mário empreendeu durante sua gestão como prefeito. Realizou o ajardinamento e calçamento das principais praças da cidade, abriu novas ruas, promovendo o desenvolvimento de novos bairros. Na praça Tiradentes, construiu a fonte luminosa, restaurada recentemente, e o abrigo de ônibus, além de artísticas calçadas, desde a Praça Barão de Queluz. Na Praça São Sebastião construiu o prédio denominado Quitandinha e dotou aquele espaço de outros atrativos para o lazer de crianças e adolescentes. Substituiu os antigos calçamentos por paralelepípedos em mais de uma dezena de logradouros e promoveu a abertura e manutenção de estradas na zona rural, interligando os distritos. Seu mandato como prefeito encerrou-se em 1945. Em 1959, foi eleito vereador pelo distrito de Cristiano Otoni. Disputou eleições para prefeito, em 1962, quando venceu o pleito Dr. Orlando Baeta Costa.
O cronista Gilberto Victorino de Souza, em sua vasta obra sobre personalidades lafaietenses, destaca que Doutor Mário foi “dotado de uma personalidade inconfundível, era sinceramente estimado por todos aqueles que sabiam compreendê-lo em todos os seus aspectos. (...) Era completamente avesso a exibições demagógicas e ao farisaísmo político, tão comuns em nossa época. (...) Dotado de boníssimo coração, são sem conta o número de pessoas, em nossa cidade, que por ele foram beneficiadas”. Doutor Mário Rodrigues Pereira faleceu no dia 10 de setembro de 1964.

sexta-feira, agosto 22, 2008

Em campanha

A campanha dos candidatos para as próximas eleições teve mais um impulso na última semana, com o início dos programas no rádio e na TV. Hoje não vemos mais os abusos cometidos em eleições passadas, com muros e postes forrados de propaganda, calçadas alcatifadas de cédulas, outdoors dominando todo o panorama da cidade, carros de som pelas ruas, durante todo o dia, com jingles apelativos e cansativos. Numa feliz hora, moralizou-se essa pressão psicológica a partir da pressão visual e auditiva.

Agora, os candidatos têm que se comportar direitinho, para conquistarem, com muita simpatia e educação, os votos necessários para a eleição. Tarefa árdua, porque ainda tem o quociente eleitoral adotado, dificultando ainda mais o sufrágio nas urnas. Pelas ruas, deparamo-nos com modestas placas, rigorosamente dentro das medidas permitidas pela lei, confeccionadas, muitas vezes, com esmero por empresas publicitárias, de acordo com a pecúnia disponível para gastar com a campanha. Sorridentes, fisionomia geralmente “tratada” em softwares especializados para tal, slogans criativos e chamativos estão estampados nas calçadas, discretamente, porém em pontos estratégicos, disputando a percepção dos transeuntes.

O mais interessante nisso tudo é a forma como se apresentam. Figuras bem vestidas, outras discretas, às vezes informais, a sisudez e a desenvoltura expressam, ora uma, ora outra, o perfil do candidato, isso quando confunde o eleitor, denotando falta de seriedade com o que se propõe. São os apelidos, desde os mais corriqueiros aos esdrúxulos. Assim, temos o Fulano da Padaria, o Sicrano do Açougue, o Beltrano da Gerarda (só para ilustrar); ingênuos, se não fossem as apelações sugerindo até desrespeito, não por si, mas com os eleitores, como se se tratasse de imbecis, pessoas pouco providas de discernimento, sendo quase preciso - como caçoam os jovens - desenhar para melhor compreender.

Salvo engano, em Lafaiete não lançaram mão de alcunhas depreciativas ou ofensivas para se apresentarem à população; mesmo assim, ainda são muitos. É de se preocupar quando esses apelidos, engraçados ou pouco polidos, enquanto se destacam pela comicidade, aludem o oportunismo, associando a pessoa ao segmento em que está inserido. O eleitor que não procura conhecer melhor o seu candidato, muito menos saber o seu nome correto, o que se espera dele? Não poderá nunca reclamar alguma cousa, pois será recebido, quiçá ouvido, com tão pouca importância, quanto a que dispensou ao processo democrático da eleição dos candidatos ao cargo público.

sexta-feira, agosto 15, 2008

Sobre a família

O mês de agosto é reservado à reflexão sobre a vocação, na Igreja Católica. As diversas formas de chamado são abordadas, seja para a vida religiosa e o ministério sacerdotal, seja para a missão de cada um na sociedade e na família. E sobre o papel da instituição familiar na formação humana, há 16 anos celebra-se a Semana Nacional da Família nos dias seguintes à comemoração do Dia dos Pais.
Este ano, ecoa-se ainda o tema da Campanha da Fraternidade – “Escolhe, pois, a vida” (Dt 30,19), como opção primordial para que se preserve de todas as formas da corrupção aquela que, há muito, é considerada célula mater da sociedade. Nesse escrínio, devem-se conservar e fomentar os valores necessários para a consolidação de uma sociedade justa, dentro dos princípios cristãos.
Todavia, uma batalha constante temos presenciado em detrimento da família; o pior, uma batalha legal. Sim, isso acontece a partir do momento em que se buscam de todas as formas legalizar o aborto, possibilitar a dissolução da instituição familiar e agilizar o processo jurídico, usá-la como “peça” para usurpação de uma vúlnera social lamentável, a miséria; relativizar os conceitos basilares de sua formação, incentivando a liberdade espúria que agride a natureza e a ordem das cousas.
Ao contrário do que se pode deduzir, as pessoas se permitem, nesse processo, serem aprisionadas pela satisfação pessoal, pelo hedonismo hodierno, negando a liberdade e a dignidade individual. Nas palavras do papa João Paulo II, isso produz “efeitos destruidores na vida familiar, comunidade anterior e fundamental à sociedade e ao Estado; por outro lado, a destruição da natureza e da missão da família provoca a destruição da própria sociedade, pois a família é a única instituição capaz de promover os valores que permitem a harmonia e coesão sociais” (cf. 5ª Assembléia Gerald o Sínodo dos Bispos, 1980).
“Escolhe, pois, a vida” é a opção que, desde as Sagradas Escrituras, a Igreja no Brasil propõe às famílias. Essa escolha deve se efetivar com o comprometimento do trabalho missionário de cada um. O campo é vasto no seio das famílias: casais desestruturados, filhos rebeldes, grupos assanhados em corromper a disciplina pessoal e a ordem social, pelo modismo e por seduções intelectuais. Cabe, pois, a cada cristão, corresponder ao chamado divino e se entregar, sem temor, à sua missão a partir dessa “igreja doméstica”, parte do tecido eclesial com suas funções inalienáveis.

sexta-feira, agosto 08, 2008

Discurso convincente

Começou a corrida eleitoral e já se pode ver a repetição dos mesmos erros, pelo menos no discurso. Depois, quando se abrem as urnas e o resultado surpreende “até o mais indiferente” – como costuma citar o Frei Tibúrcio – como a frágil vítima de um adultério entregam-se ao questionamento: “onde foi que eu errei?” Muito simples. Basta ouvir, atentamente, com frieza, racionalmente, os discursos inflamados proferidos durante a campanha e logo se encontram os motivos pelos quais não conquistaram a simpatia e, muito menos, a confiança dos eleitores.

Em Conselheiro Lafaiete começaram já os pronunciamentos dos candidatos. O Jornal CORREIO, além de apoiar a iniciativa do Sindicato do Comércio varejista de sabatiná-los, está publicando, há duas semanas, uma série de entrevistas com todos os “prefeitáveis”, abordando um determinado tema a cada edição. Na primeira semana foi sobre a expansão industrial da região e os reflexos no municípios e, esta semana, acerca da situação da saúde. Neste pouco tempo conseguimos perceber os projetos de cada um, ou seja, nada tem de convincente.

Indistintamente, alguns caem no equívoco de ficar apenas apontando erros alheios, sem apresentar uma proposta que possa suprir as carências que atingem diretamente a população. Outros, talvez por ingenuidade, imaginam seus eleitores mais simplórios ainda para assimilarem – para não dizer acreditarem – nas suas propostas de governo. Depois, ele ainda insiste em acreditar que foi traído pelos amigos, pelos correligionários, pelos seus eleitores; nunca que o fracasso foi o seu discurso, ora fraco e sem sentido, ora virulento e assustador.

A proposta deve ser necessária, exeqüível e beneficente à população e ao município. O que as pessoas querem ouvir? É a certeza de um ordenamento orçamentário que possibilite mais o desenvolvimento de Conselheiro Lafaiete; é uma política que viabilize uma segura expansão industrial, não apenas rebarbas de um proveito que acaba se transformando num caos social para os lafaietenses, com o aumento do custo de vida e de todo tipo de desordem social; a saúde não quer apenas mais profissionais para atender a população, mas estrutura-física condizente (e o Hospital Regional?); na educação, não basta apenas garantir vagas para crianças e jovens nas salas de aula, necessita-se de qualidade de ensino, professores bem qualificados e atualizados; a segurança pública tem uma parcela de responsabilidade que cabe ao município, não só aos órgãos competentes do Estado.

Quem quiser ganhar as eleições, deverá estar em sintonia com o que o eleitor quer ouvir e fale de forma seja compreendido. O erro de muitos é julgar-se onipotente em sua fala; aliás, Claude Pepper, político norte-americano, dizia que “o erro de muitos políticos é esquecer que foram eleitos; ficam achando que foram ungidos”.

domingo, agosto 03, 2008

Bernardo Guimarães em Queluz

Foi inaugurada, no mês de dezembro de 2006, a restauração da casa onde residiu o poeta e romancista Bernardo Guimarães, em Ouro Preto, passando a abrigar a Fundação de Arte de Ouro Preto (Faop) e o Núcleo de Ofícios de Ouro Preto. Na ocasião, a imprensa da capital deu ampla cobertura, falando sobre o processo de restauração pelo qual passou o imponente sobrado do século 19 e a respeito de mais um espaço destino a promoções culturais naquela Imperial Cidade. Porém, mais uma vez, a passagem de Bernardo Guimarães por Queluz de Minas foi omitida, senão citada discretamente em seu cronológio.

Bernardo Guimarães, de acordo com seus biógrafos, teria chegado em Queluz em 1873, para reger as cadeiras de Latim e Francês; alguns deles chegaram a afirmar que fora nomeado ara o Liceu de Queluz. Observa-se, entretanto, que nessa época não havia nenhuma escola de curso ginasial na cidade, senão as escolas primárias “uma para meninos e outra para meninas”. Poderia supor-se que residia em Queluz e lecionava no renomado Colégio Matosinhos, em Congonhas. Mas, por que não residia então naquele distrito?

Daí poderia ser porque fora nomeado Juiz Municipal para este termo – uma outra informação de um de seus biógrafos. No entanto, até o momento, não foi encontrada uma prova documental, não obstante ficar-me a impressão de ter visto sentença sua assinada em processos dessa época, no Cartório de Órfãos, podendo ter-me incorrido em equívoco.

Em Queluz, Bernardo Guimarães residiu em uma casa que existia na antiga rua dos Barrancos, no trecho hoje denominado rua Desembargador Dayrell de Lima, onde posteriormente funcionou o Colégio Monsenhor Horta. Essa casa foi residência do padre Cândido Tadeu Pereira Brandão, que foi vigário colado da freguesia de Nossa Senhora da Conceição entre julho de 1823 a 16 de abril de 1848. O vigário era natural daqui, tendo nascido em 1785 e falecido a 2 de janeiro de 1850; era filho do capitão Manoel Pereira Brandão e de Jacintha Georgiana de Mariscote. Ordenou-se presbítero secular do Hábito de São Pedro, a 3 de maio de 1812, por dom frei Cipriano de São José. Exerceu a capelania de Dores (atual Capela Nova), de outubro de 1816 a abril de 1817, vindo ser coadjutor do vigário Fortunato Gomes Carneiro, sucedendo-o após sua morte. Apresentado para vigário colado por Carta Imperial de 21 de junho de 1824, foi colado a 17 de agosto seguinte. Exerceu na Vila o cargo de professor particular de Latim e exerceu a vereança entre os anos de 1845 a 1848, quando presidiu a Câmara. Nesse último ano, o Presidente da Província concedeu-lhe licença na vigararia com vencimento até que ele se restabelecesse de uma catarata, tendo falecido dois anos depois.

Durante os anos que residiu em Queluz, até por volta de 1877, aqui nasceram os filhos de Bernardo Guimarães, Isabel, em 1873, e o poeta Afonso da Silva Guimarães, que pertenceu à Academia Mineira de Letras, falecido em 1955. Nesse período, também, foram editadas duas de suas poesias mais conhecidas e consideradas pornográficas, embora não sejam de seu período bestialógico, “O Elixir do Pajé” e “A Origem do Mênstruo”, publicadas clandestinamente em 1875. O seu célebre romance “A Captiva Isaura” (conhecido hoje como “A Escrava Isaura”), também é dessa época, conforme consta de um contrato com a Editora Garnier, cujo original se encontra, hoje, na Editora Itatiaia, de Belo Horizonte, que adquiriu os direitos daquela. Todavia, isso não prova que o romance teria sido escrito aqui, muito menos se inspirado numa realidade específica de alguma família queluzense, até mesmo porque existe a tradição na família de que ele teria escrito o livro quando passava temporada na fazenda da família, em Ouro Preto.

O motivo pelo qual veio parar em Queluz talvez tenha sido influência do conselheiro Lafayette Rodrigues Pereira, com quem trabalhara no Rio de Janeiro, no jornal “Actualidade”. Lafayette, mesmo distante de sua terra natal, sempre ingeria-se na política local, por meio de seu pai, o Barão de Pouso Alegre, e de seu irmão Washington Rodrigues Pereira. A afinidade que tinha com Bernardo Guimarães também se comprova por um bilhete que lhe escreveu pedindo sua opinião sobre um soneto que escrevera:

Meu caro Bernardo Guimarães,

É este o soneto de que te fallei. Conheces a história. A minha bella noiva perdeu a razão há quatro annos. E eu não sei como diante de tão rude golpe ainda conservo a minha. Pobre moça! Eu me sinto capaz de todos os sacrifícios por ella.

O nosso Flávio, que sujeita tudo à razão fria, acha que eu sou um desequilibrado, Mas tu, que és poeta, não pensas assim.

Teu do c. [coração]

Lafayette

Rio, 28 de março de 1867.

A noiva a que se refere Lafayette talvez seja uma de quem comentara com seu irmão Washington numa carta, quando era presidente da Província do Ceará. Flávio Farnese foi companheiro de ambos também no jornal “Actualidade”. O soneto é o seguinte:

“Consagrei-te no alvorecer da vida

O que tinha em meu ser de puro e santo

- ilusões, a alegria, a dor, o pranto,

A esperança de etérea cor tingida.


A voz tua ressoava sentida

Aos meus ouvidos, como ignoto canto;

Tua fronte vertia estranho encanto

De sombras e de mistérios cingida.


Mas a luz que te iluminava a mente

Apagou-a o Aquilão da adversidade

E deixou-me, de mim, de Deus descrente.


Amei outras. Ó, fora uma impiedade!

Pálida, semimorta, inconsciente,

Foste sempre e és a minha divindade!”

O período em que Bernardo Guimarães residiu em Queluz não foi dos melhores. Acometido pelas desventuras que envolvem os fracos os abatem tão facilmente, teria o poeta, já no final de sua vida, passado os dias perdendo-se entre a inspiração e a necessidade de anestesiar-se da realidade. Bernardo Joaquim da Silva Guimarães, nascido em Ouro Preto, a 15 de agosto de 1825, após deixar Queluz, retorna ao seu torrão natal para morrer pobre, a 10 de março de 1884.

Casa onde residiu Bernardo Guimarães na cidade de Queluz (MG)