sexta-feira, abril 11, 2008

Será a verdade?

Resisti, a princípio, comentar os últimos episódios políticos em Conselheiro Lafaiete. O motivo? Vergonha. Nunca na história da cidade um administrador público foi “convidado a prestar esclarecimentos”, buscado em sua casa, às 6h (da manhã, para que fique bem claro), sobre irregularidades em sua administração. Nunca. Foi a primeira vez. Aqueles de quem, noutros tempos, os órgãos competentes suspeitaram e as línguas ferinas acusaram de mau gerenciamento do erário, podem hoje se sentir honrados com isso, pois pela punição deduz-se a hediondez do crime. Até então, nenhum deles foi preso por isso. Enquanto, aquele que se jactou de uma lisura, transparência, retidão, que, agora constata-se, talvez nunca tenham existido, é “convidado a prestar esclarecimentos” à Polícia Federal. “O pior celerado é aquele que oculta suas mãos manchadas de sangue e incita o ódio contra os inocentes” (Bossuet in “Discours sur l’histoire universelle”, 1682).

Chega a causar-nos comiseração dos órfãos desorientados, das viúvas inconsoláveis, dos credores desesperados que ficam de um sistema que, mero reflexo do atual governo da República, permitiam-se à quimera de que viviam na rica Pasárgada do Império Persa, por serem “amigos do rei”... E os abutres que se travestiam de dedicados fâmulos, agora aguardam, em largos rodopios, o momento de se debruçar sobre a fétida carnagem que resta desse latrocínio moral, pela violência com que foi atacada a ingenuidade de muitos, oxalá até daquele que foi “convidado a prestar esclarecimentos”.

Na manhã do dia 26 de março, após ter caído o pano de cena na Câmara, encerrando os trabalhos da Comissão Processante, expressei, neste mesmo espaço, a indignação da falta de energia dos vereadores que a compuseram. Eles cerraram os olhos e preferiram a omissão, obviamente por interesses pessoais. E hoje, neste mesmo espaço, ocupo-me com este tema apenas para lembrar que ninguém é “convidado a prestar esclarecimentos”, da forma como foi, e por lá permanecer, se não houver indícios de seu comprometimento com o que se investiga. Ora, se ele permitiu e até se beneficiou, deve ser castigado. Se foi omisso – pior ainda, por covardia, deve ser censurado. Se não sabia do que estava acontecendo, deve ser desterrado por incompetência, pois o homem que não se cerca de pessoas confiáveis, que não tem conhecimento do que se passa sob o seu teto, é um pascácio ou um alienado. E vem-nos à lembrança o provérbio popular, assaz grosseiro, que bem justificaria sua “inocência”: “quem com porcos se mistura, farelos come”.

A certeza que nos consolou há pouco mais de um mês efetivou-se na última semana: “nihil diu occultum”. A verdade começa vir à tona.

quinta-feira, março 27, 2008

Na paz do Senhor

Chegou-nos na manhã da última quinta-feira, dia 27 de março, a notícia do falecimento do cônego João Baptista Gomes Neto. Há muito vinha padecendo as agruras da enfermidade e, finalmente, no enlevo dos eflúvios pascais, foi chamado a participar do gozo eterno que nos resgataram a paixão e morte de Cristo. E neste tempo em que a Santa Igreja canta a vitória da vida plena sobre a morte, cônego João Baptista já participa dessa alegria perenal, junto daqueles que o antecederam na graça da visão beatífica.

Foi um padre santo. Não temo fazer esta afirmação, nem tocado pelo escrúpulo de exceder-me em decorrência da amizade que nutríamos mutuamente, ou na emoção deste instante. Foi, sim, um padre santo. Santo no sentido de ser-nos apontado como exemplo de cristão a ser seguido. Impressionava-me o amor puro que tinha por Deus, a confiança na proteção de Nossa Senhora e a dedicação ao ministério sacerdotal. Em todas as vezes que dava mostras dessa sua devoção, parecia um infante à mesa eucarística pela primeira vez; podia-se notar o brilho de seus olhos. Era todo de Deus.

No púlpito, bastante experimentado pela prática pastoral que teve na zona da Mata, onde trabalhou por muitos anos, buscava a simplicidade das palavras e os paradigmas do dia-a-dia para melhor compreensão de seus ouvintes. No confessionário, era o ouvinte tranqüilo, o conselheiro bondoso, um pai amoroso sempre a indicar a senda segura na via espiritual. No altar – ah, no altar! – revestia-se nitidamente do alter Christus, entregando-se todo ao seu ministério. Visivelmente, tinha satisfação em, todos os dias, subir à ara santa e renovar o Santo Sacrifício da Cruz. Compreende-se aí a fonte de sua santificação, a Santa Missa, como nos assegura o padre Garrigou-Lagrange: “A santificação de nossa alma se encontra em uma união, cada dia, mais íntima com Deus, união de fé, de confiança e de amor”.

Uma saudade muito dorida feriu-nos o peito, ao sabermos do passamento do cônego João Baptista. Há muito não o via, apenas tinha notícias por telefone e pelos que lá iam visitá-lo; talvez afeta-me um remorso por não ter ido mais vezes vê-lo, mas somos reféns de um açodamento que nos impede até de ir estar com os que nos são tão caros.

Na cidade, poucos, talvez, se lembrem dele, afinal já se faz mais de dez anos que ele foi-se embora daqui. Os amigos e ex-paroquianos foram se informando uns aos outros. Nem um dobre fúnebre soou dos campanários da Matriz, avisando seus ex-paroquianos. Restou-nos afogar as lágrimas no coração, oferecendo um sufrágio a Deus Nosso Senhor pelo descanso eterno do bondoso cônego João Baptista.

Requiescat in pace.

quinta-feira, março 20, 2008

Ó árvore bendita

Aprendemos que existem duas fontes da revelação de Deus Nosso Senhor: as Sagradas Escrituras e a Tradição. Nelas estão o depositum fidei, donde os sucessores dos Apóstolos tiram as jóias que ornam a espiritualidade cristã, reafirmando as verdades eternas, alimentando a humanidade na sua caminhada rumo à Jerusalém celeste. E nos últimos dias, "visitando" os Padres da Igreja, constatamos, mais uma vez, a intimidade que eles experimentaram com os escritos sagrados, numa escuta atenta à voz de Deus, ecoada pela força do Espírito. Comunicando-nos, até nossos dias, uma pessoal experiência de Deus, a ponto de ilustrar de forma catequética todo o emaranhado de fatos e de personagens que se apresentam testemunhando a mão divina na caminhada milenar do homem.

Uma de suas ilustrações é sobre da fonte do primeiro pecado e da graça da redenção. Relata-nos um dos Padres que, encontrando-se na agonia da morte, enviou Adão seu filho Set ao Jardim do Paraíso em busca de remédio. Em lá chegando, o anjo que guardava a entrada ouviu-o, cortou um ramo da árvore de cujo fruto comera Adão, em desobediência, entregou-a a Set e disse-lhe que, quando o ramo desse o seu fruto, seu pai estaria curado. Mas o filho, chegando em casa, encontrou já o pai morto. Set plantou, então, o ramo na cabeceira da sepultura de Adão.

O ramo cresceu e transformou-se em frondosa árvore. A rainha de Sabá, conhecedora dessa história, relatou-a a Salomão, advertindo-o de que aquele madeiro seria a causa da ruína de seu povo. O sábio rei mandou cortar a árvore e enterrá-la. No entanto, ao nascer Jesus a árvore voltou à face da terra e, quando o Divino Mestre foi condenado à morte, foi justamente essa árvore que deu a madeira para o seu sacrifício. E os Padres descobriram com renovado sabor a palavra das Escrituras: "A árvore deu o seu fruto".

A prevaricação de nossos primeiros pais culminou com o maior ato de amor, que somente um Deus poderia cometer, dar-se completamente pela nossa salvação. O Criador humanou-se e se entregou à morte ignominiosa para que o seu sangue purificasse a descendência de Adão. A vida de Jesus, seu exemplo, sua entrega, condensa-se, como aponta-nos São Paulo, num símbolo tão contraditório quanto simples e evocador: a cruz. A transgressão da cruz, onde a dor dos homens de todos os tempos é excedida sem medida, tem a sua hora marcada na carne, autêntica fonte de um amor que não se contém a jorrar a flux, recriando, plenificando, devolvendo à vida. Essa "kenose" da cruz, como vemo-la no Apóstolo dos Gentios em sua Carta aos Filipenses, é a consumação do amor num sacrifício perene que se repete, incruento, todos os dias, sobre os altares. Fruto daquela árvore.

sexta-feira, março 14, 2008

Momentos de reflexão... para os políticos de Lafaiete

A Semana Santa, este ano especialmente, deveria ser um momento de especial reflexão para os políticos de Lafaiete. Não apenas pelo momento propício para tal ato de crescimento ascético, mas principalmente pelos “pecados públicos” cometidos ultimamente por eles. Frei Tibúrcio, certamente, não lhes pouparia a medieval prática da auto-flagelação como expiação de suas prevaricações.

Acredita-se que os ditos “homens de bem” se apresentam à comunidade como exemplos de retidão e capazes de administrar a “coisa pública”, com a disposição para exercerem o governo democrático. Seriam a voz altissonante do povo nos parlamentos, seriam o timoneiro dessa embarcação social que conduz os homens, singrando pelos oceanos do desenvolvimento humano. Mas não. Acabamos, sempre, por constatar que não passam eles de míseros pecadores, em meio à essa de ímpios, num mundo que clama por respeito e justiça, erguida sobre uma torrente de dejetos lançados pelos maus governos, conspurcando a honra do cargo que muitas vezes ocupam.

Mesmo não sendo regra geral, haveria de ser para o porvir, e antes para a emenda dos viciados na desonra, sem nenhum pudor, para que, ao mirarem as faltas alheias, lembrem-se de manter na conduta idônea aos representantes legitimamente eleitos pelo povo. Para exercerem bem o seu mandato, é preciso que lancem mão dos tradicionais livros de espiritualidade (fora com as modernas teorias da psicanálise), para reconhecerem o seu nada – “nihil est”, sua insignificância, e compreensão clara e profunda de que o que são e o que têm, nada mais é do que graça de Deus.

Portanto, na contemplação da paixão e morte de Cristo – o Deus que se humanou para expiar o pecado de nossos primeiros pais – que os políticos lafaietenses busquem a conversão de seus modos e o bem-estar de nosso povo. Que deixem de viver voltados apenas para o seu meio e percebam, ao seu redor, os mais de 100 mil habitantes à mercê de seu governo. Até outubro, ainda há tempo de darem provas de uma mudança radical de vida e de suas despretensiosas capacidades, senão a do engrandecimento de Conselheiro Lafaiete.

Boa Páscoa!

No pretório

Tramita no Supremo Tribunal Federal, em Brasília, um dos processos mais polêmicos da história jurídica do país, envolvendo questões morais e éticas. E nestes dias em que se comemoram a paixão, morte e ressurreição de Cristo, torna-se oportuno refletir sobre a responsabilidade dos ministros da Suprema Corte. Exercerão, eles, o papel de lídimos magistrados, a quem cabe assegurar a justiça na condução na Nação, desvinculados de qualquer compromisso pessoal, seja ideológico ou afetivo, mas comprometidos unicamente com a verdade? Ou serão Pilatos hodiernos, eximindo-se de sua responsabilidade, crédulos na frigidez científica, apenas, denotando até falta de conhecimento profundo para julgar uma questão tão complexa? Mais uma vez na história, assistimos à condenação de inocentes indefesos.

Laivos de esperança, contudo, despontam-se. Cremos ser a Providência Divina indicando o caminho a seguir, protegendo-nos da ilusão que o açodamento científico muitas vezes nos seduz. Realizaram-se, recentemente, novas descobertas científicas sobre células-tronco (ou estaminais) adultas, que não implicam a eliminação de vidas humanas, ratificando a batalha ética liderada, principalmente, pela Igreja. Equipes japonesa e americana teriam conseguido transformar células de pele humana em células-tronco, capazes de evoluir em células nervosas, cardíacas ou em qualquer dos 220 tipos de células do corpo humano. De acordo com a Federação Internacional de Associações Médicas Católicas (Fiamc) a nova técnica, ainda que exija aperfeiçoamento, é tão promissora que o cientista que conseguiu clonar a primeira ovelha do mundo, Ian Wilmut, teria anunciado que deixará de lado a clonagem de embriões para focalizar-se nas células-tronco derivadas de células da pele.

Infelizmente, cientistas e leigos ainda resistem à compreensão e à aceitação de que a vida humana nascente é digna de todo respeito, mesmo ainda não terem, essas experiências, sucessos garantidos, ao contrário da pesquisa e tratamentos com base nas células-tronco adultas, que já dão resultado. Ao tratar com elas não se destroem embriões, aliás, procedimento com êxitos muito valorizados nas sociedades ocidentais desenvolvidas e eficazes.

A nova descoberta científica, uma resposta ao apelo dos católicos do mundo inteiro que vinham alimentando essa esperança, impelidos pela voz do Vigário de Cristo, reafirma que “a ética que respeita o homem é útil também para a pesquisa e confirma que não é verdade que a Igreja esteja contra a pesquisa: está contra a má pesquisa, que é nociva para o homem, constatando que todos os milhões destinados a pesquisar com células embrionárias se converteram em um ‘esbanjamento’”, conforme observou o presidente da Academia Pontifícia para a Vida, dom Elio Sgreccia.

Enquanto isso, alguns movimentos no Brasil insistem na liberação das pesquisas que sacrificam embriões humanos. São os Herodes de nossos dias coagindo os Ministros da Suprema Corte a procederem como Pilatos.

segunda-feira, março 10, 2008

Há 200 anos...


O Brasil está lembrando, com algumas comemorações, os duzentos anos da chegada da Família Real. Em janeiro realizaram-se algumas festividades em Salvador (BA), onde primeiro aportou, e neste sábado, dia 8, será o ponto alto das comemorações na cidade do Rio de Janeiro, onde se fixou a corte portuguesa. Os Círculos Monárquicos se esforçaram para que a efeméride fosse lembrada com gratidão pelos brasileiros, mas a leviandade republicana tratou-a apenas como mais uma data histórica a ser comemorada, sem dispensar-lhe o necessário escopo de resgatar a dignidade da Casa Real Portuguesa que, ao deixar Portugal para não sucumbir à tirania napoleônica, veio inaugurar um novo tempo, veio redescobrir o Brasil.

Alguns historiadores afirmam que, há algum tempo, dom João, ainda como príncipe regente, já manifestara a possibilidade de ultrapassar o Atlântico e se estabelecer além-mar, dissuadido, contudo, pelos seus. O momento, no entanto, fez-se oportuno, quando as tropas de Napoleão marchava já em terras lusitanas em direção a Lisboa onde, indubitavelmente, renderia os Bragança e, certamente, como fizera na Espanha, exilaria-os nalguma quinta, no interior português, e colocaria no trono algum de seus protegidos. Aí sim seria a espoliação de Portugal em todos os sentidos.

É quando reage o equivocadamente considerado "bobo" Príncipe Regente. Chegara o momento de partir para assegurar a soberania da Coroa Portuguesa. Os preparativos foram, sim, às pressas; tiraram tudo o que lhes foi possível; atropelavam-se a caminho do cais; muita gente ficou, com as tropas que alcançavam já os montes ao redor de Lisboa, "a ver navios". Mas ninguém pode negar que atitude de dom João foi uma das mais acertadas, não apenas para garantir o seu domínio, mais ainda, para o desenvolvimento do Brasil.

A partir da chegada da Família Real à Terra de Santa Cruz inicia-se uma nova fase. O país conhece, então, o desenvolvimento em todos os sentidos. A abertura dos portos, declarada ainda quando estava na Bahia, foi o primeiro passo para o deslanchar comercial, e a criação de instituições assegurou o ordenamento da administração pública: Banco do Brasil, Real Gabinete de Leitura, escolas, tropas que asseguravam a segurança, um revigoramento social e intelectual, tudo isso foi primordial para que, poucos anos depois, a nacionalidade brasileira fosse ratificada coma elevação a Reino Unido e, em 1822, a fundação do Império do Brasil.

Há 200 anos o Brasil era redescoberto por dom João - O Clemente - que reafirmou a vocação desta terra bendita, onde a sucessão de seus atos a confirmou como o Império do Cruzeiro do Sul.

Viva el Rei!

"Ubi veritas?"

Chegou ao fim o affaire Júlio Barros. Uma liminar da Justiça suspendeu a sessão da Câmara de Vereadores, que votaria a cassação do prefeito de Lafaiete, na última terça-feira, dia 26. O Circo de Cavalinhos foi armado, muitos se divertiram bastante e agora se acabou a brincadeira. Pensaram ter sido o suficiente para atiçar a população, com vistas à campanha eleitoral que se inicia daqui a poucos meses, para o pleito de outubro próximo.

Ao final de pantomima, não sabemos se rimos ante tanta tibieza, às raias de uma ingenuidade pueril, ou se lamentamos pela frivolidade com que muitos assistiram e até participaram desse processo. E volto a me envergonhar de tanta gente sem princípios, desordeira, mal informada, arrogante e oportunista que quis tirar proveito dessa ameaçadora cassação, de ambos os lados, tanto correligionários, como opositores.

Nestas linhas onde, muitas vezes, permiti-me levar pela admiração do trabalho realizado pela Câmara de Vereadores de Conselheiro Lafaiete, hoje lamento não poder fazê-lo com a mesma sinceridade. E um ditado antigo, assaz grosseiro, bem traduz a frustração desse instante histórico que poderia ter sido gravado nas páginas das crônicas lafaietenses para a posteridade exaltando o brio do Poder Legislativo, resgatando a dignidade de muitos inocentes acossados pela injustiça: "ejusdem farinæ". Todos os vereadores se comprometeram por causa da fraqueza ambiciosa de alguns poucos dentre os seus.

Se houve denúncia, é porque havia algo que comprometesse a lisura do processo administrativo, aliás, como a Comissão Parlamentar de Inquérito apurou. Se se constituiu uma Comissão Processante foi porque existiram elementos que a movessem. A inaptidão da Comissão foi não ter realizado o seu trabalho a tempo, beneficiando o acusado que, é bom ressaltar, não foi absolvido. Ele apenas conseguiu uma liminar que adiaria a sessão que aconteceria no último dia do prazo legal. Portanto, frustrou-se a Comissão por ineficiência de seus membros, a propósito, pivôs de todo esse vergonhoso desfecho.

A declaração do presidente da Câmara, pastor José Boaventura, de que as urnas fariam esse julgamento foi acertada. As urnas apurarão, sim, o julgamento dos lafaietenses que, certamente, reiterarão a opção de quatro anos atrás. E seria muito bom que isso acontecesse, para que a oposição amargue por mais quatro anos a incompetência e o oportunismo de tantos que a ela se misturam, subjugada pelo governo que tentaram derribar. Consola-nos, por fim, que "nihil diu occultum". Cedo ou tarde a verdade virá à tona.

sexta-feira, março 07, 2008

Pátrias irmãs


Discurso proferido na reunião conjunta da ACLCL com a Academia de Letras de São João del Rei, dia 30/09/2007, naquela cidade.

É indescritível a sensação que nos toma neste instante em que, qual num ato litúrgico, reunimo-nos nesta solenidade, inspirados pelos sentimentos fraternos e pelo civismo que nos move a alistarmo-nos nas fileiras que pugnam pela preservação do belo, das artes, de nossa cultura em geral.
E a essa sensação se soma a emoção de poder falar a tão eminentes confrades, guardiões deste templo sagrado, onde se conservam as referências literárias, zelosos pelos valores desta urbe que se constitui um pilar sagrado das tradições mineiras.

“Solve calceamentum de pedibus tuis:
lócus enim, in quo stas, terra sancta est.” (Ex3,5)

Sinto este sussurrar divino aos meus ouvidos. A terra onde piso é sagrada, pois nela se alteou, solidamente, os marcos que direcionam o caminhar da história. Aqui se levantou a cruz primeiro, antes daquelas que viriam a ser o centro governamental destas terras, a cujo reflexo floresceu a fé católica que se espalhou pelas Gerais. Aqui se travaram as primeiras lutas pela consolidação do que é hoje nosso grandioso Estado.
Não deitaria incenso nos turíbulos que perfumam este panteão, se fosse tíbia a devoção pela terra onde impera a Virgem do Pilar, se não me convencessem os grandes feitos de seu bom povo nesses três séculos de história.
E me sinto, nesta tribuna, temeroso pela responsabilidade que se me impõe, ao dirigir-me à fina flor da intelectualidade são-joanense, que, em meio às tempestades das paixões e críticas desencontradas, peculiares numa sociedade inconsciente, não pensante, acende em suas frontes os santelmos luminosos que os distinguem como tal.
Temo profanar este templo, onde a palavra há de sempre se elevar; temo profaná-lo se não reverenciar ex imo corde a plêiade de insignes varões que imaginariamente se postam neste recinto, na lembrança de cada um, nas crônicas deste silogeu, na história de São João del Rei.
Mas, sabedor do espírito cristão de nossa gente, confortado ainda pela afirmação do Conde Carlos de Laet, de que, “neste habitáculo das letras, a tolerância não é somente uma virtude, mas uma exigência impreterível”, atrevo-me a falar em nome dos caros confrades da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette.

Nesta confiança, dirijo-me aos Senhores membros da Academia de Letras de São João del Rei para externar nossa satisfação ao prosseguirmos com o intercâmbio que se iniciou no último verão, quando recebemos atenciosa visita de uma comitiva são-joanense em nossa solenidade de final de ano. Eram os primeiros passos de um relacionamento mais próximo entre as duas entidades irmãs, aliás, um resgatar de relações passadas entre São João del Rei e Carijós, um reaproximar de duas pátrias irmãs.

Embora a Real Vila de Queluz tenha se emancipado da Vila de São José, em 1790, até a terceira década dos oitocentos esteve ligada à Comarca do Rio das Mortes, o que, daí em diante, não significou um distanciamento, conquanto já fosse acendrado o comprometimento fraterno de inspiração e de ideais.
Essa esplêndida significação orna esta especial oportunidade em que o resgate do passado destas duas cidades nos dá uma idéia viva da eternidade da correlação assim existente.
Carijós, como muitas outras localidades, surgiu no alvorecer da civilização mineira, após os áureos raios do sol da prosperidade ter se lançado sobre o Campo das Vertentes. E para lá seguiram os que por aqui passaram, e lá se fixaram muitos que aqui nasceram.
A partir daí, já se observa essa amizade que, apesar da distância geográfica, perduraria pelos séculos seguintes pelo afeto, pelos ideais e, principalmente, pela fé.
E por essas veredas do tempo vai-se acentuando essa convivência, como num dos mais inflamados instantes de nossa história, a Conjuração Mineira: aqui como um dos focos – por que não dizer o berço? – das aspirações democráticas em Minas; lá como uma espécie de parlamento dessas proposições, mais precisamente nas estalagens da Varginha e das Bandeirinhas.
O momento, no entanto, não era aquele. Precisava a brasilidade ser mais burilada, os ideais menos apaixonados, o pensamento mais solidificado nas convicções ortodoxas. Assim, quando o momento se fez oportuno, São João e Queluz se posicionaram, garantindo a integridade do Império do Brasil que se inaugurava. E, logo, logo, em dois momentos vemo-las juntas, marchando com os mesmos propósitos. O primeiro, na sedição de Ouro Preto em 1883, em imediata reação, nas palavras do Cônego José Antônio Marinho, “na heróica Vila de Queluz” levantou-se o movimento de resistência à rebelião e a Câmara de São João del Rei chamava ao presidente Manuel Inácio de Sousa e Melo para que aqui se instalasse o governo provisório. Isso, porém, não se sucedeu dada a firmeza com que se desbaratou os revoltosos. Poucos anos depois, ainda afligidos por inconseqüências reacionárias, levantou-se a coluna dos liberais, reunindo gente de cá e de lá na Revolução de 1842 que, não obstante terem vencido os legalistas, a bandeira dos derrotados, doravante, norteou muitas decisões de S. M. Dom Pedro II.
Minas se engrandecia cada vez mais; o Brasil se reafirmava como o grandioso Império do Cruzeiro do Sul, com a participação de ilustres personagens, entre muitos, que nasceram à sombra dos campanários são-joanenses e os que se refugiavam sob o cerúleo manto da Senhora da Conceição de Queluz.
E não poderia deixar de citar a receptividade do 11º Regimento de São João del Rei, num dos recentes e trágicos episódios da historia universal, quando para cá vieram 67 jovens lafaietenses se prepararem para lutarem no Velho Mundo, nos instantes decisivos da Segunda Grande Guerra Mundial
Em todos os momentos, São João e Conselheiro Lafaiete – desde os tempos de Carijós – miram dois destinos do desenvolvimento, a grandeza e a felicidade, não da maneira insensível como o mundo no-los apresenta hoje, racionalista, paganizada, como que na formação de uma “humanidade sem Deus”. Mas diferentemente, na convicção de que a crença em Deus é o mais firme alicerce da ordem social, correndo sempre a depositar na ara santa, baluarte inexpugnável da nacionalidade, os seus tributos de ação de graças.
Se se crê num Brasil hoje democrático, este estado tem um quê de mineiridade; vivificou-se com o bafejo das aspirações de nosso povo, desde aqui, para toda a Terra de Santa Cruz.

É por isso, Senhores, que nesta sessão em que se reafirmam os objetivos comuns dos que nos antecederam, se reafirmam, também, os objetivos comuns da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette e da Academia de Letras de São João del Rei. É como que para professarmos, unidos, os mesmos ideais de cultuar e preservar o idioma pátrio, com o qual se canta nossa história, com o qual melhor se expressa nossa cultura.
Externo nossa gratidão, primeiramente, ao professor João Bosco da Silva, que com sua participação no Concurso Literário promovido por nossa Academia possibilitou essa aproximação proposta pelo acadêmico Antônio Guilherme de Paiva e efetivada, hoje, sob os auspícios da presidência do acadêmico Wainer de Carvalho Ávila.
Doravante, mais unidos, continuaremos a defender nosso Brasil não apenas com o que nos impõe a cidadania, mas principalmente com os elementos, não menos indispensáveis, se não mesmo essenciais à existência da nacionalidade, que são a fé, a língua e as tradições culturais. Mercê de Deus Nosso Senhor, não se tem hoje muitas cidades descurado deste sacrossanto e patriótico dever, ao erguerem, ao lado dos templos religiosos, tão marcantes em nossa cultura, santuários, como este, da língua pátria e das tradições locais.
Hoje, quando muitos oscilam entre um estrangeirismo muitas vezes iconoclasta e um pseudo-nacionalismo rubro e indefinidamente equivocado, urge defendermos o patrimônio das riquezas imponderáveis da lídima brasilidade. E tal como o povo hebreu conservava outrora, na sua preciosa Arca da Aliança, toda revestida de ouro, o maná do deserto, as Tábuas da Lei e a vara florida de Arão, da mesma forma, guardemos e salvaguardemos, também nós, no escrínio de nossos cenáculos, o maná da fé patriótica, as tábuas da lei do civismo e o ramo sempre em flor das tradições de honra e bondade de nosso povo. Assim, fraternalmente unidos, marchemos resolutos e confiantes para o futuro, que é a Terra da Promissão, terra onde florescem, como rosas de Jericó, os ideais que não morrem, e dos quais somos destemidos propagadores, pois nos situam e nos consolam no tempo, cristalizando-nos no olimpo onde se imortalizam os feitos de nossas Academias.
Tenho dito.

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Eis-me aqui

Domingo passado, a comunidade do Colégio Nossa Senhora de Nazaré comemorou o jubileu de ouro de profissão religiosa da irmã Maria Ermelinda de Carvalho. Uma Santa Missa foi celebrada em ação de graças, reunindo, além da comunidade religiosa das Pequenas Irmãs da Divina Providência, familiares e amigos da jubilanda. Foram momentos oportunos para a reflexão sobre o entregar-se a Deus e o doar-se à sua obra. Durante a homilia, padre Lambert Noben ressaltou a grandiosidade dessa resposta ao chamado “Vem e segue-me”, feito por Nosso Senhor, cuja aceitação repercute pelo bem que se faz ao próximo, nessa entrega total.

Há muito, ouvimos falar da falta de vocações sacerdotais e religiosas. Certa vez, ouvi de um virtuoso sacerdote que se faltam vocações não é porque Deus não estaria chamando os “operários para sua messe”; são as pessoas que, envolvidas pelo burburinho dos atrativos do mundo, não se permitem ouvir a voz divina que, insistente, sussurra-lhes: “Vem e segue-me”. As promessas do mundo são sedutoras, assim como humanamente foram sedutoras as tentações do demônio a Jesus; decerto, outra cousa não poderia se esperar deste reino cujo príncipe já foi julgado.

A família também é responsável por essa insistente omissão de tantos que são chamados e não se empenham em ser escolhidos. “Se não existem religiosos santos, é porque não temos famílias santas”, asseverara o referido sacerdote. Realmente, na intimidade da família é que se molda o caráter das pessoas e, principalmente, se acende a flama da piedade no coraçãozinho dos pequenos, para que, doravante, arda a fé inabalável que há-de sustê-los por toda a vida, qual uma armadura que protegerá esses valentes soldados de Cristo nos combates contra o mundo, contra a carne e contra o demônio.

Uma das causas dessa escassez de vocações também foi apontada pelo Papa Bento XVI, na segunda-feira última, dia 18, durante audiência aos membros do Conselho para as relações entre a Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica e as Uniões Internacionais dos Superiores e Superioras Gerais: o processo de secularização que avança na cultura contemporânea, influenciado até as comunidades religiosas. O Sumo Pontífice antevê, no entanto, uma força do Espírito Santo movendo muitas “almas generosas dispostas a abandonar tudo e todos para abraçar Cristo e o seu Evangelho. (...) É o desejo comum, partilhado com pronta adesão, de pobreza evangélica praticada de maneira radical, amor fiel à Igreja e generosa dedicação ao próximo necessitado, com especial atenção às pobrezas espirituais tão presentes na nossa época”.

Esse fenômeno observado pelo Beatíssimo Padre é semelhante ao que moveu irmã Ermelinda quando deu o seu “eis-me aqui”, em resposta ao chamado divino. Cada vocação é como um redescobrir do carisma de cada congregação. A aceitação é mais um impulso ascético, apostólico e missionário no processo de redenção da humanidade. Que o exemplo da entrega total de irmã Ermelinda seja um incentivo para muitos que anseiam, mas ainda titubeiam, em corresponder ao convite que Nosso Senhor faz para que “leve a pleno cumprimento a obra por ele iniciada”, como nos exorta o Santo Padre.



quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Desastres históricos

Há momentos na história que mais parece o rumo das cousas ter se desviado dos desígnios divinos. Há sempre uma mostra disso. Portugal, nossa Pátria-Mãe, lembrou-se, comovida, na última semana, do centenário de um desses instantes, o regicídio de Dom Carlos e do Duque de Bragança, Dom Luís Felipe. Como era de se esperar, os meios de comunicação não se aprofundaram no tema, ou fizeram-no sem se aprofundar no que causara esse lamentável desfecho, até a queda da monarquia naquele país, dois anos depois. Na comemoração do último sábado, no Terreiro do Paço, local onde o Rei e o Príncipe Herdeiro foram friamente assassinados, diante dos súditos que os aclamavam, uma solenidade lembrou o fatídico 1º de fevereiro de 1908, seguindo-se uma Santa Missa na Igreja de São Vicente e visita ao mausoléu onde jazem os restos mortais daqueles mártires da monarquia lusitana, naquela mesma igreja.
Ainda fazia-se moda pelo mundo derrubar as monarquias a todo custo. Era um assanhamento que se despontara ainda lá pelos setencentos, incendiado pelos iluministas, e que foi formando proselitistas pelos anos seguintes, moldando novas correntes ideológicas, provocando um caos nas sociedades. “Quanto mais uma calúnia custa a acreditar, maior é a memória dos tolos a fixar”, diz Casimir Delavigne, e desta forma foram disseminando suas loucuras influenciando até hoje os pensadores modernos, com rastros de desilusões e até de sangue pelos séculos passados. Essa observação teve-a o padre Pedro Quintela, que, na solenidade no Terreiro do Paço, referiu-se a Dom Carlos como um rei nobre e valente, morto pelas balas de ódio, cegueira, injustiça e ressentimento.
“Haverá flagelo mais terrível do que a injustiça de armas na mão?”, indagava Aristóteles, e a resposta obtiveram-na os portuguesas nos anos seguintes, com a famigerada república a partir de 5 de outubro de 1910, as inconstâncias políticas de um regime nada consolidado num país de tradição monárquica, a ditadura que, apesar de tudo, protegeu Portugal da sanha comunista que ameaçava o mundo em meados do século passado, mas estendendo-se por anos de repressão. Esse foi o prêmio dado pela República aos portugueses.
E aí, não mais apenas os monarquistas ou saudosistas, buscam compreender o que se perdeu desde 1908 a 1910 na assimilação do processo histórico. E aí bem se cabe a sentença do também português Alexandre Herculano: “Se mandarem os reis embora, hão de tornar a chamá-los”.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

O direito à vida

Na última quarta-feira, iniciou-se no Brasil a Campanha da Fraternidade, promovida desde 1963 pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). A cada ano, um tema é apresentado pelo episcopado para a reflexão de todos, atento à realidade e à necessidade do momento. Há dois anos já havia sido definido o tema para 2008: “Fraternidade e defesa da vida”. A vida: graça de Deus para os crentes e um mero existir pelos céticos, mas à qual se apegam uns e outros, numa desconfiança do porvir após a morte ou simples gostar de viver. Com isso, buscam-se recursos muitos para prolongar a presença de cada um neste mundo.

Entretanto, esse desejo de viver, esse apego ao mundo, acaba por conduzir o mundo por sendas em que essa vontade se acentua de tal forma que priva essa graça ou direito de outrem. Assim temos, numa primeira percepção, a polêmica do aborto. Por que praticá-lo? Seria por egoísmo, por não querer dividir-se com alguém? Seria por tamanho amor-próprio que não se permitiria doar a uma parcela sua que também se faz homem? Como detestar a carne de sua carne, o sangue de seu sangue, mesmo que essa concepção tenha sido traumática ou, como dizem, indesejada? Seria tanta soberba a ponto de se julgar senhor da vida? Da mesma forma a eutanásia é defendida, como se a vida dependesse apenas da vontade do homem.

Daí se segue também outra polêmica questão, que é a do uso dos preservativos e contraceptivos. Constatam-se, então, os equívocos que desnorteiam a conduta do homem – em nosso caso dos brasileiros – e querem impor ao mundo e até à natureza a “ordem” que defendem. São sem sentido as críticas que lançam contra a Igreja, como se ela fosse uma mera entidade, regida por estatutos humanamente alteráveis ao bel prazer de seus dirigentes e à necessidade do comodismo que se busca em nossos dias. Ora, a Igreja é uma instituição divina – para os que assim crêem e como ela mesmo se define – e a ortodoxia de sua doutrina é imutável, assimilada em todos os tempos sem interpretações relativistas. Ao se opor ao uso de preservativos ou contraceptivos ela não se mostra insensível aos riscos de se contrair doenças sexualmente transmissíveis ou outras “conseqüências”, como a de gestações indesejadas; ela tanto se preocupa que indica o remédio que possui para isso, que é a prática da castidade segundo o estado de vida. Ridículo? Não. Ridículo é sair por aí gozando a vida feito animais irracionais, atraídos pelo cheiro ou seduzidos pelas formas, desrespeitando-se e aos outros também.

E por aí se seguem outras tantas desordens que colocam em risco a vida humana. O desejo incontrolável do ser, do ter e do poder levam o homem, desestruturado moralmente, buscar a afirmar-se à custa de tudo o que tem ao seu alcance. Assim vemos o domínio que se vai aumentando sobre o sofrimento, seja ele físico ou moral, dos outros. Atualmente, no Brasil, o tráfico de drogas é um dos responsáveis pela desorientação social, a desestruturação das famílias e pelo fracasso de muitos jovens. Para sorver de um prazer momentâneo, efêmero, vão se destruindo. Isso é conseqüência de uma neo-barbárie a que assistimos impor seus limites, definindo seus domínios, é quase como que uma guerra civil que ameaça deflagrar-se - senão já em combate – sem nenhum motivo étnico ou ideológico, simplesmente pelo mostrar-se mais forte, como os bárbaros de antanho.

Por isso, a CNBB propõe a reflexão sobre o direito à vida, orientando a defesa e a promoção da existência humana, desde a sua concepção até à morte natural, “compreendida como dom de Deus e co-responsabilidade de todos na busca da sua plenificação, a partir da beleza e do sentido da vida em todas as circunstâncias, e do compromisso ético do amor fraterno” (cfr. Texto-base da CF 2008).

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

Educação sexual

Às vésperas do carnaval, a sensualidade atrai a atenção de todos. Numa sociedade que se despe de todos os princípios e a televisão e a internete se tornam canais quase que exclusivos de divulgação da licenciosidade, os pais desatentos não zelam pela formação dos filhos. A criticada atitude do arcebispo de Olinda-Recife fortalece o coro dos insensatos e o que deveria se promover de forma a educar, principalmente as crianças e os adolescentes, acaba escandalizando-os, ainda que iludidos com essa perplexidade, como se lhes apresentasse uma fórmula mágica garantindo-lhes um “prazer seguro”.
Observa-se, contudo, que não se questiona a origem e a natureza desses atos; parece pretenderem navegar na confusão, misturando os conceitos que definem a educação sexual, da sexualidade, da afetividade, noutras dimensões além de uma mera informação. Percebe-se que não compreendem que educar, na verdade, é ajudar a crescer, a discernir e a escolher, a respeitar e a comunicar. Nesse processo induz a se abrir à responsabilidade dos atos que se praticam. Dá-se capacidade para se fazer com alegria o que se deve e não apenas o que apetece. É um meio de formar pessoas que se respeitem e respeitem os outros; ajuda-se a perceber que nem tudo o que se pode fazer, convém que se faça. A educação tem exigências concretas para quem educa e para o educando. Tarefa digna, mas cheia de conseqüências.
Porém, a campanha de educação sexual que temos assistido por aí parece andar, para muita gente, unida à convicção de que a atividade sexual não tem limites e é um direito para quem assim o quiser, seja adolescente, jovem ou adulto. Por isso defende-se a distribuição de preservativos durantes os folguedos momescos. E essa campanha atinge nossos adolescentes e jovens que se enfileiram nesse “cordão” da licenciosidade. E o que querem os promotores dessa campanha? Que as pessoas apenas não contraiam DSTs e as mulheres não se engravidem? É o que parece. Não se interessam em formar pessoas equilibradas, alegres, sábias, respeitadoras de si próprias e do próximo. Não querem que elas se conscientizem de que o valor da pessoa não vem do número das suas experiências sexuais, mas da sua capacidade de responsabilidade e de domínio pessoal.
A sexualidade é uma força e um dinamismo de vida que não se esgota na relação sexual, mas se exprime numa relação pessoal alargada e enriquecida de mil maneiras, que traduzem em doação, respeito e ajuda mútua. A atividade sexual, a qualquer nível, é sempre humana e humanizadora, por isso não se pode separar da afetividade. Nunca se fará educação sexual apenas informando ou somando saberes diversos; muito menos essas campanhas surtirão algum efeito nesse sentido, ao possibilitarem a desordem dos sentidos. O verdadeiro processo de educação visa a realização de um projeto de crescimento e de fidelidade, cada vez mais necessário e urgente, requerendo atenção e competência. Que estejam todos atentos.

sexta-feira, janeiro 25, 2008

Os verdadeiros amigos

“Não é amigo quem busca a utilidade, nem quem se recusa a associar a amizade à ajuda, porque um procura o tráfico da recompensa e o outro destrói o laço de confiança”. Esta sentença de Epicuro, cognominado filósofo da amizade, é oportuna para refletir nestes dias, em que na política local nos detemos com a realidade das amizades ante o interesse pessoal. Parecia a todos, creio, que existia uma amizade entre as pessoas que compõem o governo municipal. Com o tempo, desde que se iniciou o mandato, alguns foram se afastando, o que reforçava mais ainda essa crença. Ora, se se afastaram é porque não correspondem a contento ao programa traçado para a administração pública, ou não comungam das mesmas idéias, ou ainda tinham outros interesses, demonstrando aí nenhum comprometimento com o que propunham.

Quando o ex-procurador municipal se atira em busca de uma vaga na Câmara de Vereadores, num momento em que o município assiste a uma das mais medonhas crises, que é a ameaça de cassação do prefeito (para quem trabalhava, diga-se de passagem, e de quem parecia ser amigo), ele bem se enquadra nas palavras do filósofo ateniense: “Não é amigo quem busca a utilidade, nem quem se recusa a associar a amizade à ajuda”. O ex-procurador municipal buscou seu interesse apenas e recusou ajuda ao “amigo” que dela necessitava; ademais era sua obrigação atuar como tal, pois era sua função.

Mais uma vez, nota-se a desordem entre eles e a vítima deste momento não pode, ainda, experimentar a afirmação de Aristóteles, que “na pobreza, como no infortúnio, os homens encontram o seu único refúgio nos amigos”. Ela viu mais um se afastar e pôde atestar a sinceridade de muitos que ainda a rodeiam e até de alguns outros que, mesmo distantes ideologicamente, ainda lhe voltam um olhar solidário, atestando que a amizade é muito mais do que estar próximo, na pobreza e no infortúnio; é experimentar uma afeição mútua, uma dedicação e lealdade que avançam as raias do altruísmo, muito além da mera cooperação, a ponto de colocar os interesses do outro sobre os seus. “É a aceitação de cada um como realmente ele é”, afirma Carl Rogers. Aí vemos que talvez o prefeito tenha sido realmente amigo do ex-procurador, pois o aceitou como ele sempre foi, a ponto de dar-lhe asas para voar em busca dessa quimera, que é um assento entre os vereadores, que ele tanto criticou (é bom lembrar), talvez por muito ambicioná-los.

Neste momento, não são os subterfúgios do ex-procurador, muito menos a capacidade de compreensão do prefeito, que se levam em contam, mas a pusilanimidade e a ingratidão que revestem os atos daquele e que correm o risco de passar à história como uma marca de sua personalidade e um dos momentos do atual governo municipal. E aí constatamos o que ouvimos, certa vez, de um pregador: “os amigos são como tábuas de salvação que nos fogem da mão na hora do naufrágio”.

sexta-feira, janeiro 11, 2008

O perigo na comunicação

Quando a verdade, a mentira, a defesa, o ataque, o sim, o não e o talvez passam a compor correntemente o vocabulário daqueles de quem se pede um pronunciamento, parecem ganhar uma autonomia semântica e se podem jogar no tabuleiro das marcações indefinidas, sem preto e branco, sem ângulos definidos ou quadrados perfeitos. São, na verdade, os esquivos de meias verdades, do conveniente, ou, como se diz, do hodiernamente correto, tornando-se temas centrais nas discussões políticas, nas rodas amistosas, na cobertura da mídia.
Não fazemos um jogo de palavras, nem reduzimos as questões importantes à aplicação de estratégias em ordem à conquista ou manutenção do poder, ou às manobras de oposição aos governos legitimamente instituídos pelo povo. Esta sutileza é como uma areia fina, quase líquida, que se infiltra em tudo, influenciando todas as áreas, como a saúde, educação, esporte, artes e até religião, com vistas a assegurar uma "posição" ideológica. Só não se consegue, com isso, a transparência de seus atos e a sinceridade íntima do coração.
Nessa confusão de pensamento, presa fácil para incutir essa desordem, sempre foi o leitor. Daí a necessidade de ele, sempre que tomar uma notícia, um artigo, livros, discursos, aplicar necessária dose do bom senso e cuidar-se para não se influenciar pelo "sedutor" canto de sereia de alguns pseudos formadores de opinião, que se arvoram a patronos do bem comum. Com a facilidade de publicações, em nossos dias, muita cousa tem vindo à lume, antagonicamente, em plenas trevas do discernimento, quando não alterados pelos interesses de alguns "mecenas" sequiosos em meter um cabresto intelectual nas pobres vítimas dos dominadores de idéias, quiçá apedeutas afetados, frustradamente náufragos no oceano da imbecilidade.
Só que neste mundo de avanços, já não bastam dominar apenas os que se ocupam das letras. Os sinais ameaçam mais. A TV, a internet, o telefone, enfim, as formas que possibilitam imediatas trocas de informação e meios de se efetuar a comunicação, principalmente a silente comunicação visual, faz com que o receptor ignore o essencial do que se vê e do que se pensa; os filtros e as lentes matizadas de um pensamento ambíguo tudo alteraram. E a verdade continua a viver na clandestinidade. Será mesmo verdade que as palavras são os meios menos eficazes para se comunicar? As evidências são as tintas mais comuns para iludir a realidade? Por isso, importa sempre indagar-se: o que estará escondido por trás desta mensagem tão clara? Certamente, a desordem social e moral a que assistimos, num constante dizer e desdizer do sim e do seu contrário, se entenda melhor no enquadramento das palavras transformadas em artificiais escudos de proteção e setas de arremesso.

quinta-feira, janeiro 03, 2008

O mal hodierno

Um mal expande-se por todo o mundo em nossos dias, como se verifica pelas pesquisas que apontam o alto e ainda crescente número de usuários de medicamentos antidepressivos. Até crianças, vítimas inocentes, muitas já se sentem afligidas por esse mal. E a partir daí culpa-se a forma e o ritmo da vida que se leva, agitada, sem tempo para nada, nem para ninguém, levando-se em grande conta o tão falado estresse, levando a uma perda do sentido da vida, desvanecendo-se sonhos e projetos, soçobrando no oceano de problemas que vão se criando ou deles tornando-se vítima. E o vazio que vai se expandindo no íntimo destrói os horizontes pessoais, os familiares e até os comunitários, cortando as asas ao pensamento, a vontade, a beleza, o afeto, secando a fonte interior que alimenta a vida.
Outro fator que contribui para essa desolação é a alteração dos valores morais sem objetividade. As referências que norteavam a existência foram-se pondo de parte, afirmando-se direitos subjetivos que não respeitam relações e compromissos assumidos. A dimensão religiosa também foi relegada para segundo plano, quando não dispensada, porque sentem Deus como um incômodo, pois não admitem demarcações em sua liberdade. A perenidade dos laços que alicerçam as vidas cedeu ao efêmero e ao inconsistente da satisfação pessoal. Enfim, uma sociedade que vai perdendo o rumo, perdendo-se na inevitável depressão.
Sabe-se que a propensão a essa enfermidade correlaciona-se à satisfação e à frustração dos desejos. Há, por exemplo, apelos interiores a que o consumismo nunca responderá. No estado de depressão revelam-se, assim, a seu tempo, as fragilidades humanas, psicológicas e espirituais que se respiram hoje na sociedade. O cortejo dos deprimidos aumenta e as soluções mais fáceis não passam de paliativos. Ora, a fonte de energia vital está dentro da pessoa, não está fora. Há que procurá-la ou reencontrá-la aí. O que vem de fora pode condicionar, não determinar comportamentos. Sem ânimo suficiente para seguir adiante, acomoda-se ao mal, principalmente os fleumáticos, ou entrega-se à farmacodependência, ou rende-se à sedução de pitonisas, ou ao fanatismo religioso. Mas nunca se encontrará, por aí, seguras sendas por onde poderá se desenvolver a personalidade, cultivar a força interior, revigorando sua existência pessoal, com maturidade necessária.
Cada um leva dentro de si a ânsia e a possibilidade do bem e da verdade. No entanto, elas tanto podem ser destruídas, como alimentarem e fortalecerem; porém a opção é livre e pessoal. É mister, contudo, que a humildade esteja sempre no projeto de uma vida sadia, destacando-se com a prudência nos momentos de confronto. A depressão não é um fatalismo. O homem é quem permite as influências que a provocam.

Analisando friamente

Desde a semana passada, Conselheiro Lafaiete vive dias apreensivos; ou melhor, o governo municipal vive dias apreensivos. O motivo é a instalação de uma Comissão Processante na Câmara Municipal, para julgar a defesa do prefeito ante a denúncia apresentada por um cidadão, após a longa e, para a população, ainda inexplicável conclusão dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Interessante essa amostra de globalização até das percepções: o povo brasileiro está tão acostumado com CPIs, que não se interessa em acompanhá-la ou, sequer, saber do que se trata. Em Lafaiete não foi diferente.
Só que o desinteresse das pessoas e o apelo à sua sensibilidade emocional não valerão neste momento, muito menos nenhuma chantagem política. E inculca-nos a preocupação do prefeito e de seu entourage em querer se explicar à população indiferente, sendo que - creio - seria muito mais simples, transparente e até democrático provar sua lisura à Comissão Processante da Câmara. Alguns "mestres-salas" do chefe do executivo têm se mostrado ridiculamente desorientados com a possível cassação do prefeito. Mas por que, se ele é inocente? Reuniões de grupos específicos, correios eletrônicos, cartazes, faixas, passeatas, para que tanto tumulto se as denúncias, conforme eles sustentam, são improcedentes?
Ora, realmente, o grupo que sempre apregoou a honradez, a liberdade e a democracia está se contradizendo, ao desonrar a competência do Legislativo Municipal, que, torna-se oportuno lembrar, neste caso é apenas um instrumento para que se execute o que o Estado Democrático garante a um cidadão. No entanto, tornou-se ocasião propícia para os governistas se declararem hostis àqueles que lhes são desafetos na Câmara.
A liberdade também, com isso, é ferida. Quem diria: a liberdade! Mas todo sistema que tende ao absolutismo a trata como uma fera, mantendo-a ao seu controle. E tanto corromperam o sentido de liberdade que macularam o princípio democrático que diziam defender ardentemente. Em suma, a honra desse grupo é relativa ao quanto lhe convém, assim como a liberdade é a simples tradução de sua medíocre vontade, única norma de suas ações. E a democracia? Ah, essa se a pratica por meio da "ditadura das aparências", ou seja, o que vale não é o fato em si, mas o que se revela dos fatos, o que é dito, escrito e mostrado, sob o controle deles, assumindo uma maior e decisiva relevância em relação à realidade.
Que toda essa celeuma em torno das denúncias seja apenas uma incontrolável reação dos pares do prefeito, decorrente da afinidade que lhe têm. Porém, caso contrário, se forem confirmadas as irregularidades, esses inflamados correligionários poderão estar denotando conivência com o erro.

A virilidade

Por muitos séculos, a virilidade do homem foi demonstrada pela sua força física e pelo poder. Perdeu-se, assim, o sentido sobrenatural, que é a força do espírito, a virilidade cristã, resgatada pelo sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ora, perdera o homem a força viril, sã e admirável, que emanou de Deus na criação a partir da desobediência dos primeiros pais. Ele, porém, não a restabeleceu, embora pudesse, porque, conforme explica o padre José Meireles Sisnando, "seu poder de amor não se satisfaz em refazer 'como d'antes', mas a 'inventar' (=providenciar) o 'melhor do que antes'" (cf. in Reflexões sobre a virtude da força cristã).
Ainda hoje bafeja aos ouvidos, principalmente dos jovens, a sedução diabólica: "Sereis como deuses" (Gen3,5). E a esse impulso respondem prontamente com a arrogância, a agressividade ao próximo e à ordem natural das coisas. A conseqüência disso tudo é a violência crescente, é o relativismo da ética na sociedade hodierna, a dominação pela deturpação ideológica, a permissividade, enfim, a entrega a todos os vícios capitais. O que pensam ter conquistado pela virilidade, conquistaram, equivocadamente, pela tibieza do espírito.
O Santo Padre Bento XVI, quando de sua viagem a Polônia, numa de suas alocuções, admoestou aos católicos para que "sejam fiéis guardiões do depósito cristão e transmitam-no às gerações futuras. Estejam vigilantes, estejam firmes na fé, sejam fortes, tenham ânimo; e façam todas as obras na caridade". Esses são os exercícios essenciais que permitirão uma robustez espiritual para enfrentar as adversidades com que o mundo, a carne e o demônio desafiam o homem.
A força peculiar de um lídimo cristão é aquela que se nutre na contemplação dos mistérios divinos; é a força vitoriosa do Espírito, que se conquista somente após rebaixar-se e reconhecer sua fragilidade, sua própria impotência, permitindo, então, que a graça invada, sempre e mais, a alma. Assim, ter-se-á a heroicidade dos irmãos Macabeus, na confiança e na coragem no esforço, pois "agradam ao Senhor somente os que O temem e confiam em sua misericórdia" (Ps146,11). Só a partir daí se estará preparado para o Pentecostes pessoal, em que se renascerá, pela graça, com a virilidade cristã. Tal será a vitória do homem fraco sustentado pela força do Espírito.

Erva daninha

Tem sido crescente o surgimento de novas agremiações religiosas evangélicas no Brasil, especificamente. A cada dia, uma portinha se abre, encimada por uma placa cujos indicando mais um "templo" de oração e de pregação. Alguns se sucedem bem, outros, aparentemente, não tanto. A maioria se escora nos mesmos subterfúgios em que se amparou Lutero; a Igreja Católica continua a ser o alvo da sanhas desses neo-protestantes, que buscam ridicularizar a instituição divina que, mesmo composta por homens susceptíveis à fragilidade de sua natureza, mantém-se de pé ao longo de dois mil anos, cumprindo-se, assim, a promessa do Divino Redentor de que "as portas do inferno não prevalecerão contra ela".
O fundador de uma dessas agremiações, em recente entrevista a um jornal da Paulicéia, defendeu a legalização do aborto. Isso demonstra o quanto ele se ocupa em se opor à posição da Igreja Católica. Interessante que, sobre esse tema, já se manifestaram filósofos, materialistas, sociólogos, feministas, cientistas, entre outros, em defesa do aborto, mas exegetas, teólogos, líderes religiosos, são contundentes na posição de respeito à vida, desde o instante da concepção. Mais escândalo causa a má interpretação bíblica desse chefe de uma determinada agremiação, usando dos Livros Sagrados para cometer tamanho desvario.
O equívoco do insano "pastor" parte de uma má interpretação hermenêutica, o que era de se esperar de uma pessoa que se dedicou à pregação apenas com interesses comerciais. Ele lança mão de um versículo do Eclesiastes que diz: "Um homem, embora crie cem filhos, viva numerosos anos e numerosos dias nesses anos, se não pôde fartar-se de felicidade e não tiver tido sepultura, eu digo que um aborto lhe é preferível (cap. 6 vers. 3). E valendo-se da Sola Scriptura, princípio luterano, exime suas seguidores de toda culpa em caso de opção pelo aborto. No entanto, se ele tivesse alguma, mínima que fosse, formação exegética, encontraria, não no texto vernáculo, mas nos que mais se aproximam dos originais, a palavra que foi traduzida por "aborto". O sentido original é: aquele que não chegou a nascer. Em suma, o sentido que o escritor sagrado dá em suas palavras é o de que, uma vida sem Deus é vazia de sentido, a ponto de ser tão inútil quanto a própria inexistência", ou seja, "melhor seria se não tivesse nascido".
Lamenta-se, profundamente, que um apedeuta, como o é o tal chefe de agremiação, seja reconhecido como o "maior evangelizador do século". Mais deplorável ainda é a liberdade de que goza para difundir com, utilizando-se de todos os meios de comunicação que possui, a leviandade, a malícia e a insensatez a uma legião de pobres fiéis honestos. Esses infelizes, a maioria carente de algo que lhe suavize a aspereza da vida e os incômodos de sua consciência, porém de forma oportuna, no entanto, dão muito mais ouvidos ao fundador da agremiação religiosa a que pertencem do que à voz do bom-senso. Para esse tirano que abusa da tíbia fé do povo que o segue só lhe cabe a advertência bíblica: "Bonum erat ei, si natus non fuisset" (MT 26,24).

A pureza do olhar

A cada noticiário de TV ou de rádio, a cada edição de jornal, a cada atualização dos sites de notícia na internete, constata-se ser mais fácil semear o terror que a esperança. E tal a eficiência com que as empresas de notícia o fazem que corremos o risco de chegar à conclusão ser mais sedutor o caos que a harmonia. A dualidade do homem, a aparente cegueira da natureza, a explosão primária de instintos destruidores, a lentidão que se denota no avanço do que é bom e belo, conduz a muitas leituras desencantadas do mundo, da história e do homem, tido muitas vezes como um dependente incurável do instinto.
Para isso, não urge vaguear pelos planetas da abstração. Suficiente é ler os jornais, ver e ouvir os noticiários, quando, não raro, se desprende a náusea da onda opaca e sufocante de um mundo que insiste em não encontrar o rumo. Aos solavancos, a ciência e a técnica vão revelando e reabrindo sulcos. Mas o homem, o ser humano, parece marcar passo num lamaçal de violências, injustiças e desordens, ao peso esmagador de um pecado original de que não consegue se libertar.
Talvez não seja tanto assim. O que vemos, ouvimos e lemos se apresenta num determinado cenário um espetáculo narrativo de atração, porém com um quê de babel ou, mais próximo à nossa realidade, uma feira onde cada qual grita mais alto pelo seu produto. Daí facilmente nos perdemos na medição do que é real e do que é fictício, na construção que fazemos de nós mesmos e do mundo. Somos, a um tempo, autores, atores, encenadores e espectadores desse complexo concerto em que nunca estamos de fora. Em alternâncias de ordem e desordem.
Por isso, facilmente olhamos em volta e vemos em primeiro plano túmulos e lágrimas, como se o mundo começasse e terminasse nesse tom menor que tantas vezes desmobiliza a ação e desfoca o olhar sobre o hoje e o futuro. Tudo nos leva a essa contemplação lúgubre da miséria ou da vista sem fim, como no horizonte que as vagas atlânticas pode nos descortinar: o nada, o vazio, o sem-fim. E não buscamos o alento, não observamos atentos à nossa volta o que a natureza, o que Deus nos reserva.
Noé, quando temia perder-se no abandono, a frágil ave lhe trouxe um ramo de oliveira. E, mais próximo à nossa realidade, o profeta Jeremias, assistindo aos mais trágicos dias da história de sua pátria, numa espécie de fim do mundo que se vislumbrava em Jerusalém, conseguiu distinguir vida em meio à destruição: "Vejo um ramo de amendoeira". A pureza de seu coração e a confiança no Deus a quem devotava todo o seu coração fizeram-no contemplar o bem, o belo, o bom. "Viste bem, Jeremias! Viste bem", é o que lhe responde o Criador. Que saibamos, também, cultivar em nós um olhar de esperança, radicado na fé, vindo do fundo dos tempos. É só isso o que nos resta fazer num mundo em que muitos aspectos parece agonizante. Que tenhamos a limpidez e a inocência do olhar de uma criança.

sexta-feira, outubro 26, 2007

O irmão do outro

Nao dia 19 de setembro, o professor Cândido Mendes, uma das mais respeitáveis inteligências do país, esteve em Lafaiete, para apresentar o livro "Dom Luciano, o irmão do outro", uma observação minuciosa sobre a vida de seu irmão, dom Luciano Pedro Mendes de Almeida, arcebispo de Mariana, falecido há pouco mais de um ano. O trabalho do notável membro da Academia Brasileira de Letras, no entanto, não é uma biografia comum; é um relato sob o prisma da espiritualidade forte, convicta, na qual se delineavam os atos do ilustre prelado.
E no currente calano de Cândido Mendes vamos sentindo as vibrações causadas pela humildade de dom Luciano, virtude indispensável a quem serve. E convencemo-nos de que a humildade é a verdade que deve ressoar num tempo em que muito se vai construindo sobre a areia e a lama da meia verdade, quando não mesmo sobre a mentira e o mundo dos interesses pessoais ou de determinado grupo; a verdade é a parceria indestrutível da humildade.
Todos, especialmente aqueles cuja vida, de modo permanente ou por um tempo, se traduz em serviço aos outros, a cada um e a todos, têm por dever cultivar a humildade, essa atitude rica que acolhe sem preconceitos, escuta com respeito, responde com serenidade, orienta com paciência, agradece com delicadeza, sorri sem fingimento e deixa, por fim, o sabor delicioso e reconfortante do dever bem cumprido. Tudo isso é servir e servir é considerar o outro como razão de ser do nosso agir. Tudo isto é viver com horizontes abertos e largos, capazes de ajudar a vencer a tentação de confinar a sua ação à satisfação própria ou aos interesses dos amigos e conhecidos. E nas páginas de "Dom Luciano, o irmão do outro" encontraremos o carismático príncipe da Igreja, de origens nobres, que despojou-se de tudo, fazendo-se um permanente aprendiz, aperfeiçoando-se na prática da caridade, sempre preocupado "em que posso servir?".
E aí vemos o quanto, em nossos dias, as relações pessoais não são mutuamente enriquecedoras, multiplicando-se as atitudes de sobranceria, despeito, juízo fácil, marginalização. E as pessoas, quase todas elas, ficam a valer cada vez menos aos olhos dos outros. Ora, a comunicação humilde, própria das pessoas grandes, acolhe e aproxima, enquanto a soberba, própria dos pequenos, não ouve nem atende, é orgulhosa e levanta muros intransponíveis.
Num clima onde escasseia a verdade, não tem lugar a humildade. Verdade e humildade são inseparáveis. Por isso, o modo de ser do último arcebispo de Mariana há de ser um exemplo para todos os que conviveram com ele. Quem serve não é pessoa para complicar, mas para a facilitar. E mais valor ainda terá se servir aqueles desprovidos de nome, nem rosto, mas com dignidade a respeitar e direitos a reconhecer. Assim, então, o serviço se tornará honra e a humildade grandeza.

Aos jovens

Pelas praças centrais da cidade, na noite de sábado, observa-se a juventude. Ruas movimentadas, bares cheios, faróis e buzinas delineiam um cenário de "cidade de grande". Adolescentes e jovens dividem espaço nas calçadas. Risos, gritos, copo de bebida na mão, alguns pendem da boca um cigarro, olhares que correm de um lado ao outro em observação, à procura de alguém... E nessa perspectiva vêm-nos à mente dias, anos, passados e o porvir de nossa existência, esperando o dia em que teremos de dar contas a Deus, o "dia de ira, aquele dia de calamidade, no qual os séculos se desfarão em cinzas".
Há uma diferença muito grande entre os jovens de ontem e os de hoje. Enquanto muitos insistem em viver num constante descompromisso com a responsabilidade que a vivência nos impõe, os mais novos adiantam-se no seu tempo e buscam viver intensamente os dias. Não há comprometimento com as pessoas, com o mundo, querem somente aproveitar à exaustão todos os momentos, sem limites, muitas vezes sem bom senso. Deixam passar o mais belo instante da vida, que é aquele em que viceja a utopia da juventude, quando se olha o mundo com uns óculos de esperança e em que tudo é alcançável.
Ora, a juventude é para ser vivida, é o tempo de desbravar caminhos, de se lançar as bases da vida adulta e mais responsável. Ser jovem é acreditar que tudo pode ser feito, tudo pode acontecer e tudo pode ser superado. Como diz o Eclesiastes, o jovem tem de lançar fora a tristeza, ainda mais nos dias que correm, nesta era que faz crer aos jovens que o futuro é negro, sem realização profissional e com as dificuldades à vista. E é quando vemos a falta que a juventude sente de uma referência, não um manipulador do pensamento, mas um líder natural cujos atos e palavras atraem e naturalmente se torna um exemplo, talvez até um modelo a ser seguido.
Há muitos jovens para salvar. Por isso, é importante que todos aqueles que se adiantam na convivência com eles ajude-os a definir o mundo, despertando-os para os valores que norteiam a convivência humana e os princípios em que devem basear seus atos. Assim, poderão seguramente seguir os impulsos do coração e ao que lhes agradar os olhos, atentos que de tudo Deus Nosso Senhor lhes pedirá contas. "Regozija-te na tua mocidade e alegra o teu coração na flor dos teus anos. (...) Lança fora do teu coração a tristeza, poupa o sofrimento ao teu corpo: também a meninice e a juventude são ilusão" (Ec11,9;11).

Desespero político

Nos últimos meses, Conselheiro Lafaiete tem sofrido por causa de uma certa indisposição política, mal estar este causado pelo inquérito aberto pela Câmara de Vereadores para analisar os processos de licitações realizados pela Prefeitura, nos dois últimos anos. A CPI tornou no Brasil, nos últimos anos, um instrumento não apenas de investigação, mas, muito mais, de um sensacionalismo partidário incapaz de ser superado por um outro. A impressão causada pelas CPIs no Congresso Nacional, com uma mega estrutura midiática, para que não se perca nada, pensando no "furo" de reportagem, além de se tornar um palco onde melhor podem se desempenhar alguns protagonistas da política nacional, talvez isso tudo tenha iludido os lafaietenses, senão alguns mais interessados por essa situação, pensando numa oportunidade de maior e melhor visibilidade.
Mas nada disso aconteceu. O processo correu sigiloso e parecia não resultar em muito estardalhaço. No entanto, os acusados se adiantaram nas últimas semanas. Primeiro, uma entrevista disparou a primeira saraivada de ataques pouco fundamentados - para não dizer sem nenhum fundamento -, mesquinhos e, pior ainda, baixos. Existe um princípio de que não se ataca uma autoridade constituída, uma simples questão de boas-maneiras; isso tanto é comum que a Câmara, ao se preocupar com os comentários de possíveis irregularidades, não passou a agressões ao executivo; buscou um meio legal – que é a CPI – para averiguá-los. Depois da entrevista houve uma tentativa de mobilização da população. Organizou-se uma manifestação. Um carro de som, na véspera, circulava pela cidade conclamando os lafaietenses para participar daquele ato de solidariedade ao chefe do executivo. Foi um fiasco. Provavelmente, o alvo daquele tributo pensou como o salmista: "Rodeia-me uma malta de cães, cerca-me um bando de malfeitores" (Ps21,17).
Daí, sugere-nos uma reflexão: o que é moral política? Se olharmos a origem da palavra moral (do latim mores, relativo aos costumes), entenderíamos que a moral política no Brasil é o que ocorre em nossos dias, como sempre ocorreu. É um costume, na Terra de Santa Cruz, o oportunismo, a conveniência pessoal, a exploração, o mau-caratismo, a esperteza e tudo o que encontraria apoio no perspectivismo de Nietzsche. Não quero dizer que sua doutrina apoie essa delinqüência política, mas esta encontra, comodamente, nos argumentos nietzschianos um salvo-conduto para suas arbitrariedades, para suas imoralidades.
Mas a moral não pode se relativizar, como tudo se relativiza em nosso tempo. O princípio moral deve ser cristão e, a partir dele, será possível constatar que a moral política, ilesa dos desvios decorrentes das fragilidades humanas, ao contrário, capaz de ao menos tentar ordenar esses desvios, não existe no Brasil. E pela sua falta, vemos o que vimos na última semana em Lafaiete: um desesperado clamor para que acreditem na lisura da atual administração municipal. Ora, é dito popular que "quem não deve, não teme". Logo.

A Ordem dos Templários

Foi anunciada a publicação de um documento da Santa Sé que inocenta a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, conhecidos como Templários, das acusações que lhe foram feitas a partir de Felipe IV da França, cognominado O Belo, no século 14. Mas o documento que será divulgado não será nenhuma manifestação de Bento XVI, mas uma carta do Santo Padre Clemente V, encontrada em pesquisas dos Arquivos Secretos do Vaticano e da fundação italiana Scrinium. Nas letras do Papa Bertrand de Gouth, que reinou entre 1305 e 1314, a Ordem dos Templários é exonerada de toda culpa que a condenara, de satanismo, homossexualismo, blasfêmia e heresia. O aparecimento desse documento surge num momento assaz oportuno, quando as especulações da história medieval se intensificam, dando largos espaços às fábulas baseadas nos episódios reais. E a Ordem dos Templários, quiçá por sua grandiosidade e benemerência, tem sido um dos temas mais apreciados, desde há muito tempo.
A Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão foi uma Ordem Militar fundada em Jerusalém em 1118. Era o período das Cruzadas, em que os católicos se levantavam para libertar a Terra Santa do jugo herético dos mouros. Hugo de Payens, Geoffroy de Saint-Omer e companheiros reuniram-se, naquele instante de inflamado devotamento para resguardar os monumentos/relíquias da cristandade, formando essa ordem que protegia os peregrinos que iam ao Oriente. Para isso, criaram hospitais que se tornaram famosos pelo seu esplendor e pela caridade com que atendiam a romeiros e pobres. Para isso, contribuíram os cristãos a mancheias e a Igreja reconheceu os Templários pela aureola de prestígio e de coragem que revestia essa grandiosa obra, cuja Regra teria sido ditada pelo célebre Abade de Claraval e sua divisa traduzia todo o desapego do mundo para maior glória de Deus: "Non nobis, Domine, non nobis, sed nomini Tuo da gloriam" (Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao Vosso nome daí a glória).
O crescimento e o poderio inevitável da Ordem suscitou a invidia regum. O cenário político do Velho Mundo naquele instante era propício para a França, com o ousado Felipe o Belo no trono da Filha Dileta da Igreja e, no Trono de Pedro, o francês Bertrand de Gouth, que dois anos após o início da perseguição aos Templários transferiria a sede da Igreja, de Roma para Avinhão. Naquele momento histórico suscitava uma espécie de revolução contra a Igreja e a Civilização Cristã, no próprio seio da Esposa Imaculada de Cristo. O poderio da Ordem ameaçava política e economicamente, dada sua influência, a Felipe IV. Há exatos 700 anos, a 13 de outubro de 1307, O Belo fecha todas as sedes da Ordem, expropria seus bens e promove processos contra ela. A seu exemplo seguiram-se outros reis, exceto o de Portugal, onde o patrimônio dos Templários foi entregue à Ordem de Cristo, criada por Dom Dinis, a cujo Senhorio pertenciam as terras lusitanas, aquém e além mar.
O estudioso da Idade Média, Franco Cardini, que trabalhou na edição da obra que apresenta a carta de Clemente V ressalta que "a prerrogativa do Papa era a de dissolver a ordem, mas ele nunca a condenou". Cardini acrescenta que o documento achado "testemunha que o Pontífice não a considerava herege". A extinção dos Templários foi essencial para que o caos do gnosticismo se espalhasse. Era o prenúncio da renascença da Antigüidade Clássica.

quinta-feira, setembro 06, 2007

La contre-danse politique

O título em francês pode parecer pedante, no entanto, fizemo-lo desta forma para que, no imaginário, vislumbremos um salão de festas em que o mestre-sala anuncia o início da contradança. Mas a alusão neste momento é à contradança política.
Já se começam a ventilar nos bastidores dos partidos os "parzinhos" que deverão participar da animada quadrille em torno das cadeiras eletivas, no próximo ano. Como nos fautuosos salões da belle époque, todos se preparam para iniciar o bailado. Sinais furtivos, olhares lânguidos, declarações murmuradas, estes são os primeiros contatos antes que o prelúdio da orquestra os posicione em seus devidos lugares.
Esse clima de sedução e de expectativa é apenas o prenúncio dos primeiros passos que, cadentes, desfilam pelos salões, harmoniosos e contagiantes. Mas a esse movimento se segue um outro, cujo andamento exige mais desenvoltura, quando os pares se trocam, até que retornam à sua composição primeira e se deixam embalar, então, pelos largos rodopios do terciro e último movimento.
Na contradança política também é assim. Os flerts e discretas aproximações já estão acontecendo. Logo, logo, anunciar-se-á o início da quadrille. Todavia, experiências de antanho e o peculiar quadro que se observa sempre nessas circunstâncias, sabemos que, dificilmente, na troca de pares, a esquerda e a direita se unirão. Isso porque existe um interesse central que ambos almejam, sem jamais compartilhar com que não seja seu conviva. E ao final desse bailado, todos estarão como até então se mantiveram, unidos unicamente aos seus.
Portanto, por mais que tentem provocar alterações no ritmo peculiar dessa dança, dificilmente conseguirão que, aos acordes finais, as finas damas estejam conduzidas por algum noceu idiot rouge; elas prezam seu nome, seus modos e até a alvura de sua toilette. Uma pessoa de princípios jamais se permite contrastar com aquilo que repugna seus princípios e suas ideologias, muito menos se esta não as tem. É a realidade dessa pantomima política, que a cada quatro anos assistimos por ocasião das eleições municipais, mesmo com um aspecto de artistique ballet.

segunda-feira, agosto 27, 2007

Quis ut Deus?

Deus criou o homem à sua imagem e semelhança (Gn1,26). Esta é a afirmação do escritor sagrado ao descrever a criação divina. E o Catecismo Romano ensina-nos que "a pessoa humana é a única criatura na terra que Deus quis por si mesma e é destinada, desde a sua concepção, à bem-aventurança eterna". E mais, "Deus entregou o homem às mãos do seu arbítrio" (Eclo15,14), ou seja, sendo ele capaz de raciocínio, deu-lhe "o direito ao exercício da liberdade, exigência inseparável da dignidade da pessoa humana, sobretudo em matéria moral e religiosa".
Ora, capaz de discernir o bem do mal, o certo do errado, logo o homem deverá buscar somente aquilo que concorrerá para o seu crescimento, para sua perfeição, enfim, para sua salvação. No entanto, o relativismo, que infiltrou em todos os meios e vem contaminando todas as instituições e conceitos, está causando uma confusão tamanha na sociedade que se pode compará-lo à Babel de nossos dias. A linguagem única (a moral) que todos falavam, ou ao menos deveriam compreendê-la, já não é única. São muitos os idiomas que se ouvem (a permissividade). Eis, portanto, os dois grandes males contemporâneos: o relativismo e a permissividade.
E na última semana, tivemos mais uma comprovação dessa lamentável realidade. O governo federal autorizou ao Sistema Único de Saúde (SUS) as intervenções cirúrgicas de transgenitalização. Essa transgressão à natureza já vinha sendo consentida há poucos anos, mas agora arregimentou forças que fortaleceu os movimentos de "classe". Uniram-se esses comitês, ao Conselho Federal de Medicina e ao governo federal, com o aval da Justiça. Essa "permissão" - agora generalizada - não é uma simples questão "cultural" ou para assegurar a satisfação pessoal de um ou outro transexual.
A atitude do governo federal é como uma daquelas sacrílegas cusparadas com que ultrajaram Nosso Senhor em sua paixão. A atitude passiva do governo federal ante essas instâncias é o consentimento da profanação da criação divina, que é perfeita, para consolar os baixos sentidos que se afloraram com o pecado original e concordar com a satisfação pessoal de determinados indivíduos gerada por distúrbios psicológicos. A atitude do governo federal, por fim, é tão hedionda quanto o aborto e a eutanásia. É o clímax de sua presunção ao querer "corrigir" ou destinar a criação de Deus, levado pela mesma ambição que, segundo o Doutor Angélico, teriam se submetido os anjos que se decaíram, o desejo de se igualar a Deus. E semelhante orgulho é a causa da decadência moral a que assistimos. Bem se lê nas Sagradas Escrituras que "no orgulho tiveram início todos os males" (Tob4,14).
Quis ut Deus?

sexta-feira, agosto 17, 2007

Questão política

Sugeriram-me, dias atrás, abordar temas do quotidiano de nossa cidade. Confesso encontrar dificuldade para isso, pois um juízo provinciano, mesquinho, geralmente domina o conceito de algumas pessoas quando se vêem envolvidas em questões que dizem respeito ao bem comum. Mas, para atender ao que me foi solicitado, vamos lá.
Na última edição do Jornal CORREIO, foram suscitados os prováveis pré-candidatos a prefeito para o próximo pleito, que só acontecerá em outubro de 2008, ou seja, ainda falta mais de um ano. E o frufrulhar da sanha política já começa a se ouvir nos bastidores da política local, insinuando, salvo engano (e Deus permita que eu esteja equivocado), mais um sentimento de ambição do que o ardente desejo de dedicar-se à res publica. Essa ambição é perniciosa ao comprometer os destinos administrativos da comuna por mais quatro anos. Aliás, bendita a hora em que o Congresso Nacional permitiu a reeleição dos cargos executivos, suavizando a carência da população, eterna vítima das instabilidades dos governos "provisórios" impostos, até então, pela Constituição para céleres quatro anos. Herdeiros de uma cultura paternalista que somos, até certo ponto acomodados com uma ilusória estabilidade que os mandatos permanentes garantiriam – o que nem sempre acontece, a possibilidade de reeleição de um bom governo tranqüiliza os mais cautos. Possibilita, ainda, a continuidade de diversos trabalhos que em menos de um lustro seria impossível desenvolvê-los a ponto de atestarem sua proficiência.
Em Conselheiro Lafaiete já se experimentou a vantagem da reeleição, sucedendo-se, mercê do processo democrático, um outro estilo administrativo que, não obstante a insatisfação de determinados grupos e as dificuldades que vão surgindo na condução de políticas específicas, além dos proveitos que um e outro tendem a tirar das oportunidades que o poder lhes oferece, vai-se concluindo mais um mandato que não foi tão auspicioso como muitos esperavam, muito menos desastroso o quanto alguns acreditavam. A propósito, vem-nos à mente a afirmação de Bismarck de que "a política não é uma ciência exata, é apenas uma arte"; que não seja, contudo, "a arte de tirar o melhor proveito possível de determinadas situações", como a conceitua Maurice Barrés. Que não seja esse o escopo de alguns pusilânimes que se infiltram no entourage dos que estão no poder, senão será a ruína do governo.
Estas linhas, que se devaneiam em torno de tão complexo e, até certo ponto, detestável e, antagonicamente, fascinante tema, não propõem uma apologia à reeleição da atual administração, muito menos a sua execração. Apenas chama à atenção as pessoas de bom-senso. Que não se deixem levar pela simples oposição por motivos pessoais ou ideológicos, uma vez não haver ideologia precisa que norteie a política atual no Brasil. Que as negociações partidárias busquem propor, simplesmente, o contínuo desenvolvimento do município e o bem-estar da população, atentos a uma observação de Alphonse Karr: "em política, quanto mais ela muda, mais é a mesma coisa".

A formação intelectual de nossos jovens

Tem sido uma assustadora realidade muitos estudantes terminarem o ensino médio, e mesmo o curso superior, sem adquirir qualquer hábito de leitura, muito menos vontade de saber mais e, assim, gozar da satisfação e da alegria pelo que já conseguiram. Uma prova imediata desta pobreza e vacuidade são os exames de vestibular e, em seguida, a onda de desânimo perante dificuldades normais ao longo da formação universitária, quando estas se apresentam. Por aí se vê onde chegou o grau de cultura, aquisição de saber e capacidade de ser de muita gente que enchem as escolas durante anos. Hoje, basta-lhes um emprego que não demore, onde se ganhe bem e não se tenha muito trabalho, o resto é para intelectuais, investigadores e diletantes, porque os livros não dão pão.
Quando emerge algum jovem que, dentro ou fora de seu meio social, é reconhecido pelo seu saber, os jornais falam como se se tratasse de coisa rara, porque de fato o é. O que deveria ser normal, segundo os talentos de cada um, tornou-se uma coisa extraordinária. Não obstante, nunca houve tantos licenciados, mestres e doutores. E isso se entende, pois, quando os ensinos de formação e de profissionalização já não são mais suficientes e conseguem ser superados com displicência, torna-se necessária que as seqüentes especializações exijam mais daqueles que, arduamente, se dedicam ao pensar para o seu crescimento intelectual e que colabora com a formação dos outros. Mercê da legítima democratização do ensino e de uma exigência inegável dos novos mercados de trabalho, buscando a cada dia mais qualificação.
A cultura, por si e para muitos, não justifica tanto trabalho e, quando o emprego não está logo ali à porta de escola, lamenta-se ter um curso para nada, culpa-se o estado que ninguém quer como patrão, mas é com isso, no fundo, que se sonha. Tudo como se a longa aprendizagem, reconhecida por um diploma, não capacitasse, também, para deitar mãos à vida, saltar o muro das dificuldades, ser criativo e inovador e construir caminhos novos, que até podem ser reconhecidamente meritórios para si próprio e para outros.
Se o ideal é ganhar muito, depressa e com pouco trabalho à vista deve-se lembrar que nem todos nasceram gênios do futebol, nem milionários, e terão, por isso, de se decidir palmilhar os caminhos normais da vida, porque a sorte contempla os audazes, não os desanimados. Se nossos jovens, desde os estudos iniciais, não forem atentados pelos pais e pelos professores para a importância de sua formação - e quase a uma obrigação a isso - estarão fadados à mediocridade que está se disseminando nos meios sociais, ameaçando os círculos intelectuais, com um boçal pragmatismo sem idéias, nem sentido, que a todo custo quer empurrar a humanidade num comodismo intelectual. E neste horizonte fechado não se vê sinal de luz nem de esperança. É o futuro que se vislumbra para nossos jovens.

sexta-feira, julho 06, 2007

"Summorum Pontificum"



Será publicado amanhã, dia 7, o documento "Summorum Pontificum", do Santo o Padre o Papa Bento XVI, reafirmando o indulto perpétuo de São Pio V para a liturgia chamada tridentina. O Rito de São Pio V, que a Igreja Católica usava até 1969 (com algumas reformas, a últimas das quais datada de 23 de junho de 1962) foi substituído pelo "Novus Ordo" de Paulo VI, resultante da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II. Com o novo documento, o Papa estende a toda a Igreja de Rito Latino a possibilidade de celebrar a Missa e os Sacramentos segundo livros litúrgicos promulgados antes do Concílio, sem necessidade de permissão do bispo.
A publicação do documento vem acompanhado por uma "longa carta pessoal do Santo Padre a cada Bispo", reafirmando a possibilidade de o sacerdote que desejar celebrar a Santa Missa no antigo Rito, sem necessidade de autorização hierárquica (licença ou indulto) de um bispo. Os livros litúrgicos redigidos e promulgados após o Concílio continuarão, contudo, a constituir a forma ordinária e habitual do Rito Romano. O ritual resultante da reforma litúrgica conciliar instituía uma nova forma de celebrar a missa, não o uso do latim, mas o uso do Rito de São Pio V ainda era enaltecido pelos documentos pontifícios, inclusive por Paulo VI.
Deve-se atentar, contudo, que o "Summorum Pontificum" não significa um retrocesso, não será abolida a Missa Nova e readmitida a liturgia antiga, embora seja esse o desejo de tantos e o que, aliás, tem servido de empecilho para a reaproximação de grupos conservadores que resistem às reformas do Concílio e continuam realizando seu ministério fiéis à Igreja, porém à margem dela, gozando unicamente dos benefícios que lhes proporcionam os sacramentos, exilados da comunhão eclesial "cum Petro et sub Petro".
E aos progressistas de plantão, que entendam, se lhes for possível, essa reafirmação do indulto perpétuonão se trata de forma semelhante à possibilidade que eles têm de celebrar a Eucaristia do modo como lhes convêm, seja como a Missa Conga, a Missa Afro, a Missa dos Quilombos, Missa Sertaneja e tantos outros pseudos-ritos sem nenhuma origem apostólica, como a tem o Ritual Tridentino. Infelizmente, o documento pontifício ainda não apresenta o Rito de São Pio V como uma forma de unidade litúrgica, mas já é um grande passo, ao colocar, como o Santo Padre mesmo diz em seu documento, "à disposição dos fiéis os tesouros espirituais, litúrgicos, culturais e estéticos ligado ao Rito antigo".

segunda-feira, julho 02, 2007

Uma imperatriz santa

A ostentação que comumente se supõe quando se refere ao sistema monárquico não dita o modo de vida daqueles que, outrora, eram considerados Vigários de Cristo na terra. Dessas casas de origens milenares acenaram, muitas vezes, o progresso do mundo, a exaltação da arte, o discernimento das idéias, como também se ergueram grandes estadistas - não obstante a tirania, muitas vezes, querer tomar-lhe o ânimo - e floresceram santos. Isso mesmo, santos, pessoas virtuosas cuja conduta indicava aos seus súditos a audácia de passar por este mundo com o olhar voltado para a eternidade.
E o Brasil, no seu curto império, que durou apenas 67 anos, teve uma dedicada mãe que, vinda de uma das mais importantes casas européias, filha do último Imperador do Sacro Império, dedicou seus derradeiros nove anos de vida a esta Terra de Santa Cruz, como mãe extremosa e imperatriz devotada à dignidade de sua posição e às responsabilidades de esposa e mãe. Trata-se da primeira Imperatriz do Brasil, Dona Maria Leopoldina Josefa Carolina de Habsburgo, Arquiduquesa de Áustria. E dela temos o exemplo, além do que nos lega a história, de uma regra de vida que traçou para si mesma, cujos excertos transcrevemos a seguir:
"Desde o despertar, o meu primeiro pensamento será a lembrança da presença de Deus; minhas primeiras palavras serão: Oh! Santíssima e adorável Trindade, eu Vos dou meu coração e minha alma, Vos adoro com todos os coros dos Anjos. (...) Jamais o respeito humano impedirá de declarar-me com altivez a favor da Santa Religião Católica. (...) Meu coração será eternamente fechado ao espírito do mundo; como também longe de mim os gastos inúteis, o luxo pernicioso, os adereços indecentes, as vaidades mundanas e as vestimentas escandalosas. Minha virtude tão necessária será sempre a modéstia, para conservar a pureza de meu coração, sem a qual não saberei agradar a Deus. (...) Após meus exercícios de piedade, empregarei o resto do meu tempo a observar os deveres de meu estado e os cuidados que lhe são ligados. (...) Nas conversas falarei com bastante prudência, para não falar demais e para nada dizer que possa ferir alguém. (...) Tendo-me sido dados todos os momentos da vida para fazer o bem, empregá-los-ei segundo os desígnios de Deus. (...) Eis Jesus Cristo, meu divino Senhor, as resoluções que Vós fizestes a graça de me inspirar. Eu Vo-las ofereço com meu coração. Abençoai-as e dai-me as ajudas necessárias para colocá-las em prática. Assim seja."
Essa "santa", cuja vida foi um constante espargir de bondade e a morte um martírio necessário para que a dignidade da Casa Imperial do Brasil fosse resgatada da imprudência e dos desvarios, nasceu para a eternidade a 11 de dezembro de 1826, no Palácio da Quinta da Boa Vista.

segunda-feira, junho 25, 2007

Virtudes cristãs


A empresa novelística da TV explora, em horário inconveniente, os sete pecados capitais. Não é de se admirar, visto as fontes de corrupção da graça serem temas correntes nas telenovelas - cito estas por serem de grande audiência, de maior alcance na sociedade. E, talvez, por ser a baixeza mais rentável (por causa de seu sensacionalismo), exploram-na de todas as formas. Assim, está no ar a novela "Sete Pecados", propagando as artimanhas desses vícios que, desordenados, seduzem os homens, levando-os à decadência moral.

E ao ver a exposição dos sete pecados capitais, sugere-se a reflexão das virtudes morais que os opõem: humildade, desapego, castidade, caridade, temperança, paciência e diligência. Propostas como essas, que custam a determinação da pessoa, quiçá insinuem um "discurso medieval", como consideram alguns. No entanto, são os esforços necessários na luta contra as inclinações que levam ao mal. Isso porque, assim como o vício é uma tendência que incita ao mal, assim também a virtude arraiga em nós uma disposição que nos impele a praticar o bem. Aristóteles definiu a virtude como "um justo meio"- "in medio stat virtus". De fato, ela ocupa o lugar a uma distância igual de dois extremos. Destarte, a humildade se opõe à soberba, o desapego à avareza, a castidade refreia a luxúria, a caridade, a inveja, a temperança combate a gula, a paciência é contrária à ira e a diligência à preguiça.
Com o auxílio da graça no exercício dessas virtudes, que vão se adquirindo-as por imposição de uma tenaz determinação, o espírito se abre, sensibilizando-se às virtudes infusas que Deus Nosso Senhor concede à alma. Ora, repetição dos mesmos atos dá à nossa faculdade mais força e mais facilidade para executá-los, como a continuação das mesmas impressões embota a sensibilidade; assim é que uma pessoa se acostuma ao frio, ao calor, aos cheiros e, até certo ponto, ao sofrimento. Logo, a vivência das virtudes é uma questão de determinação e de prática, passando elas, então, a reger nossa conduta.

sexta-feira, junho 01, 2007

Questão indígena


Um certo desconforto causou a ativistas de movimentos indígenas, a determinados setores da sociedade nos países da América Latina, principalmente, e até a alguns membros da Igreja a declaração do Papa Bento XVI acerca da relação entre os missionários colonizadores e os aborígenes. O Bispo de Roma referiu-se à receptividade dos missionários pelos nativos, visto que "Cristo era o salvador que esperavam silenciosamente". Uma análise mística de seu comentário é possível, pois todo ser sempre espera algo que o complete, que lhe conceda uma plenitude existencial de tal forma que nada mais desejará. Ora, somente o Cristo pode satisfazer dessa forma, quando se alcança o grau da contemplação na vida espiritual.

Mas nem todas as pessoas conseguem compreender esse processo de crescimento, a passagem pelas moradas tão bem discorridas por Santa Teresa d'Ávila. Preferem o agrilhoamento das paixões mundanas e, por eles, conceituarem e julgarem os fatos, as coisas e as pessoas. Se assim o querem, por que, principalmente os ativistas histriônicos, não refletem sobre as verdades históricas e as reações dos nativos, em toda a América? Propalam uma lenda negra, cujo intento é caluniar a Igreja e aqueles que regaram este solo com seu sangue; Deus louvado, talvez tantos martírios foram necessários para que a fé católica florescesse na Terra de Santa Cruz e nos demais países que hoje, mesmo com a intentona do comércio da fé por inúmeras seitas evangélicas, ainda erguem sobranceiro o estandarte de Cristo Rei do Universo.

Quantos missionários deixaram sua pátria, cruzaram o oceano e vieram testemunhar o Evangelho nestas terras, embrenhando-se nas florestas, acrescentando (sim, acrescentando) à cultura indígena a européia, com a medicina, engenharia, música, literatura - como exemplo as Missões Guaraníticas. Longe de destruir as culturais locais, eles as preservaram, estimularam e as desenvolveram, desde que não fossem de encontro ao direito natural e ao Evangelho. Aí é que está o campo da discórdia, porque, certamente, esses ativistas charlatães e alguns outros imbecis mal informados estejam de acordo com o canibalismo dos Goitacazes, a promiscuidade de tantas tribos tupiniquins, os horrendos sacrifícios de dezenas de milhares de seres humanos pelos Maias, Incas e Astecas, que arrancavam o coração das vítimas e ofereciam-nos às suas divindades.

Nestes dias em que a violência é crescente, a imoralidade em todas as áreas se dissemina com tanta fluidez, em que os valores se apresentam invertidos, talvez o Papa esteja "errado" e, antes, o Evangelho. O repúdio às palavras do Vigário de Cristo, mais uma vez, confirmam a globalização da barbárie em que vivemos.

"Tupanrekê".