sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Eis-me aqui

Domingo passado, a comunidade do Colégio Nossa Senhora de Nazaré comemorou o jubileu de ouro de profissão religiosa da irmã Maria Ermelinda de Carvalho. Uma Santa Missa foi celebrada em ação de graças, reunindo, além da comunidade religiosa das Pequenas Irmãs da Divina Providência, familiares e amigos da jubilanda. Foram momentos oportunos para a reflexão sobre o entregar-se a Deus e o doar-se à sua obra. Durante a homilia, padre Lambert Noben ressaltou a grandiosidade dessa resposta ao chamado “Vem e segue-me”, feito por Nosso Senhor, cuja aceitação repercute pelo bem que se faz ao próximo, nessa entrega total.

Há muito, ouvimos falar da falta de vocações sacerdotais e religiosas. Certa vez, ouvi de um virtuoso sacerdote que se faltam vocações não é porque Deus não estaria chamando os “operários para sua messe”; são as pessoas que, envolvidas pelo burburinho dos atrativos do mundo, não se permitem ouvir a voz divina que, insistente, sussurra-lhes: “Vem e segue-me”. As promessas do mundo são sedutoras, assim como humanamente foram sedutoras as tentações do demônio a Jesus; decerto, outra cousa não poderia se esperar deste reino cujo príncipe já foi julgado.

A família também é responsável por essa insistente omissão de tantos que são chamados e não se empenham em ser escolhidos. “Se não existem religiosos santos, é porque não temos famílias santas”, asseverara o referido sacerdote. Realmente, na intimidade da família é que se molda o caráter das pessoas e, principalmente, se acende a flama da piedade no coraçãozinho dos pequenos, para que, doravante, arda a fé inabalável que há-de sustê-los por toda a vida, qual uma armadura que protegerá esses valentes soldados de Cristo nos combates contra o mundo, contra a carne e contra o demônio.

Uma das causas dessa escassez de vocações também foi apontada pelo Papa Bento XVI, na segunda-feira última, dia 18, durante audiência aos membros do Conselho para as relações entre a Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica e as Uniões Internacionais dos Superiores e Superioras Gerais: o processo de secularização que avança na cultura contemporânea, influenciado até as comunidades religiosas. O Sumo Pontífice antevê, no entanto, uma força do Espírito Santo movendo muitas “almas generosas dispostas a abandonar tudo e todos para abraçar Cristo e o seu Evangelho. (...) É o desejo comum, partilhado com pronta adesão, de pobreza evangélica praticada de maneira radical, amor fiel à Igreja e generosa dedicação ao próximo necessitado, com especial atenção às pobrezas espirituais tão presentes na nossa época”.

Esse fenômeno observado pelo Beatíssimo Padre é semelhante ao que moveu irmã Ermelinda quando deu o seu “eis-me aqui”, em resposta ao chamado divino. Cada vocação é como um redescobrir do carisma de cada congregação. A aceitação é mais um impulso ascético, apostólico e missionário no processo de redenção da humanidade. Que o exemplo da entrega total de irmã Ermelinda seja um incentivo para muitos que anseiam, mas ainda titubeiam, em corresponder ao convite que Nosso Senhor faz para que “leve a pleno cumprimento a obra por ele iniciada”, como nos exorta o Santo Padre.



quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Desastres históricos

Há momentos na história que mais parece o rumo das cousas ter se desviado dos desígnios divinos. Há sempre uma mostra disso. Portugal, nossa Pátria-Mãe, lembrou-se, comovida, na última semana, do centenário de um desses instantes, o regicídio de Dom Carlos e do Duque de Bragança, Dom Luís Felipe. Como era de se esperar, os meios de comunicação não se aprofundaram no tema, ou fizeram-no sem se aprofundar no que causara esse lamentável desfecho, até a queda da monarquia naquele país, dois anos depois. Na comemoração do último sábado, no Terreiro do Paço, local onde o Rei e o Príncipe Herdeiro foram friamente assassinados, diante dos súditos que os aclamavam, uma solenidade lembrou o fatídico 1º de fevereiro de 1908, seguindo-se uma Santa Missa na Igreja de São Vicente e visita ao mausoléu onde jazem os restos mortais daqueles mártires da monarquia lusitana, naquela mesma igreja.
Ainda fazia-se moda pelo mundo derrubar as monarquias a todo custo. Era um assanhamento que se despontara ainda lá pelos setencentos, incendiado pelos iluministas, e que foi formando proselitistas pelos anos seguintes, moldando novas correntes ideológicas, provocando um caos nas sociedades. “Quanto mais uma calúnia custa a acreditar, maior é a memória dos tolos a fixar”, diz Casimir Delavigne, e desta forma foram disseminando suas loucuras influenciando até hoje os pensadores modernos, com rastros de desilusões e até de sangue pelos séculos passados. Essa observação teve-a o padre Pedro Quintela, que, na solenidade no Terreiro do Paço, referiu-se a Dom Carlos como um rei nobre e valente, morto pelas balas de ódio, cegueira, injustiça e ressentimento.
“Haverá flagelo mais terrível do que a injustiça de armas na mão?”, indagava Aristóteles, e a resposta obtiveram-na os portuguesas nos anos seguintes, com a famigerada república a partir de 5 de outubro de 1910, as inconstâncias políticas de um regime nada consolidado num país de tradição monárquica, a ditadura que, apesar de tudo, protegeu Portugal da sanha comunista que ameaçava o mundo em meados do século passado, mas estendendo-se por anos de repressão. Esse foi o prêmio dado pela República aos portugueses.
E aí, não mais apenas os monarquistas ou saudosistas, buscam compreender o que se perdeu desde 1908 a 1910 na assimilação do processo histórico. E aí bem se cabe a sentença do também português Alexandre Herculano: “Se mandarem os reis embora, hão de tornar a chamá-los”.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

O direito à vida

Na última quarta-feira, iniciou-se no Brasil a Campanha da Fraternidade, promovida desde 1963 pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). A cada ano, um tema é apresentado pelo episcopado para a reflexão de todos, atento à realidade e à necessidade do momento. Há dois anos já havia sido definido o tema para 2008: “Fraternidade e defesa da vida”. A vida: graça de Deus para os crentes e um mero existir pelos céticos, mas à qual se apegam uns e outros, numa desconfiança do porvir após a morte ou simples gostar de viver. Com isso, buscam-se recursos muitos para prolongar a presença de cada um neste mundo.

Entretanto, esse desejo de viver, esse apego ao mundo, acaba por conduzir o mundo por sendas em que essa vontade se acentua de tal forma que priva essa graça ou direito de outrem. Assim temos, numa primeira percepção, a polêmica do aborto. Por que praticá-lo? Seria por egoísmo, por não querer dividir-se com alguém? Seria por tamanho amor-próprio que não se permitiria doar a uma parcela sua que também se faz homem? Como detestar a carne de sua carne, o sangue de seu sangue, mesmo que essa concepção tenha sido traumática ou, como dizem, indesejada? Seria tanta soberba a ponto de se julgar senhor da vida? Da mesma forma a eutanásia é defendida, como se a vida dependesse apenas da vontade do homem.

Daí se segue também outra polêmica questão, que é a do uso dos preservativos e contraceptivos. Constatam-se, então, os equívocos que desnorteiam a conduta do homem – em nosso caso dos brasileiros – e querem impor ao mundo e até à natureza a “ordem” que defendem. São sem sentido as críticas que lançam contra a Igreja, como se ela fosse uma mera entidade, regida por estatutos humanamente alteráveis ao bel prazer de seus dirigentes e à necessidade do comodismo que se busca em nossos dias. Ora, a Igreja é uma instituição divina – para os que assim crêem e como ela mesmo se define – e a ortodoxia de sua doutrina é imutável, assimilada em todos os tempos sem interpretações relativistas. Ao se opor ao uso de preservativos ou contraceptivos ela não se mostra insensível aos riscos de se contrair doenças sexualmente transmissíveis ou outras “conseqüências”, como a de gestações indesejadas; ela tanto se preocupa que indica o remédio que possui para isso, que é a prática da castidade segundo o estado de vida. Ridículo? Não. Ridículo é sair por aí gozando a vida feito animais irracionais, atraídos pelo cheiro ou seduzidos pelas formas, desrespeitando-se e aos outros também.

E por aí se seguem outras tantas desordens que colocam em risco a vida humana. O desejo incontrolável do ser, do ter e do poder levam o homem, desestruturado moralmente, buscar a afirmar-se à custa de tudo o que tem ao seu alcance. Assim vemos o domínio que se vai aumentando sobre o sofrimento, seja ele físico ou moral, dos outros. Atualmente, no Brasil, o tráfico de drogas é um dos responsáveis pela desorientação social, a desestruturação das famílias e pelo fracasso de muitos jovens. Para sorver de um prazer momentâneo, efêmero, vão se destruindo. Isso é conseqüência de uma neo-barbárie a que assistimos impor seus limites, definindo seus domínios, é quase como que uma guerra civil que ameaça deflagrar-se - senão já em combate – sem nenhum motivo étnico ou ideológico, simplesmente pelo mostrar-se mais forte, como os bárbaros de antanho.

Por isso, a CNBB propõe a reflexão sobre o direito à vida, orientando a defesa e a promoção da existência humana, desde a sua concepção até à morte natural, “compreendida como dom de Deus e co-responsabilidade de todos na busca da sua plenificação, a partir da beleza e do sentido da vida em todas as circunstâncias, e do compromisso ético do amor fraterno” (cfr. Texto-base da CF 2008).

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

Educação sexual

Às vésperas do carnaval, a sensualidade atrai a atenção de todos. Numa sociedade que se despe de todos os princípios e a televisão e a internete se tornam canais quase que exclusivos de divulgação da licenciosidade, os pais desatentos não zelam pela formação dos filhos. A criticada atitude do arcebispo de Olinda-Recife fortalece o coro dos insensatos e o que deveria se promover de forma a educar, principalmente as crianças e os adolescentes, acaba escandalizando-os, ainda que iludidos com essa perplexidade, como se lhes apresentasse uma fórmula mágica garantindo-lhes um “prazer seguro”.
Observa-se, contudo, que não se questiona a origem e a natureza desses atos; parece pretenderem navegar na confusão, misturando os conceitos que definem a educação sexual, da sexualidade, da afetividade, noutras dimensões além de uma mera informação. Percebe-se que não compreendem que educar, na verdade, é ajudar a crescer, a discernir e a escolher, a respeitar e a comunicar. Nesse processo induz a se abrir à responsabilidade dos atos que se praticam. Dá-se capacidade para se fazer com alegria o que se deve e não apenas o que apetece. É um meio de formar pessoas que se respeitem e respeitem os outros; ajuda-se a perceber que nem tudo o que se pode fazer, convém que se faça. A educação tem exigências concretas para quem educa e para o educando. Tarefa digna, mas cheia de conseqüências.
Porém, a campanha de educação sexual que temos assistido por aí parece andar, para muita gente, unida à convicção de que a atividade sexual não tem limites e é um direito para quem assim o quiser, seja adolescente, jovem ou adulto. Por isso defende-se a distribuição de preservativos durantes os folguedos momescos. E essa campanha atinge nossos adolescentes e jovens que se enfileiram nesse “cordão” da licenciosidade. E o que querem os promotores dessa campanha? Que as pessoas apenas não contraiam DSTs e as mulheres não se engravidem? É o que parece. Não se interessam em formar pessoas equilibradas, alegres, sábias, respeitadoras de si próprias e do próximo. Não querem que elas se conscientizem de que o valor da pessoa não vem do número das suas experiências sexuais, mas da sua capacidade de responsabilidade e de domínio pessoal.
A sexualidade é uma força e um dinamismo de vida que não se esgota na relação sexual, mas se exprime numa relação pessoal alargada e enriquecida de mil maneiras, que traduzem em doação, respeito e ajuda mútua. A atividade sexual, a qualquer nível, é sempre humana e humanizadora, por isso não se pode separar da afetividade. Nunca se fará educação sexual apenas informando ou somando saberes diversos; muito menos essas campanhas surtirão algum efeito nesse sentido, ao possibilitarem a desordem dos sentidos. O verdadeiro processo de educação visa a realização de um projeto de crescimento e de fidelidade, cada vez mais necessário e urgente, requerendo atenção e competência. Que estejam todos atentos.